*Por Marcus Ianoni
Façamos reformas orientadas para o mercado na vida inteira
e na pós-vida. A cada reforma feita, façamos outra, pois uma é pouca,
duas é melhor, três, ainda mais. Mas por que apenas três, se há o 4, o 5
e o 6 e se o infinito é logo ali e nos aguarda para nos recompensar?
Devendo ser as reformas permanentes e eternas, a melhora da vida real só
virá se não desistirmos de trocar essa vida passageira, de somenos,
pela maravilhosa vida do paraíso, o
mundo onírico da pós-reforma. O exagero com o perigo da inflação é
pouco, precisamos também ser exagerados com o equilíbrio fiscal, com a
eliminação de impostos inúteis e ineficientes, com o perigo do
protecionismo, com o atraso que é fazer política industrial, com a
previdência pública deficitária, com leis trabalhistas jurássicas e
custosas, com regulações sobre o fluxo de ativos financeiros, moeda e
câmbio, precisamos patentear tudo o que foi inventado pelas grandes
corporações e combater a corrupção, sempre, sempre e sempre, pois a
carne é fraca, a construção civil é fraca, a política é fraca. Tudo que é
fraco deve ser destruído. Só não há irregularidade e fraqueza no Reino
do Mercado, regido pela pureza pueril e pela virilidade. Só é forte o
Deus mercado (servido pela Justiça mercantil de Moro, PGR & Cia,
aqui no Brasil), para o qual devemos nos curvar, mantendo perante ele um
esforço de Sísifo vitalício, de modo que os humildes mortais possam
alcançar a salvação na vida-do-além, enquanto os ricos se esbaldam agora
às custas do nosso desemprego, dos baixos salários, do Estado mínimo,
do salve-se quem puder...Haverá a revolta do Estado de natureza contra o
Estado mínimo, que é sua imagem e semelhança? A mercantilização de tudo
levará à entropia do sistema ou a uma saída progressista?
* Marcus Ianoni é cientista político, professor do Departamento de
Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), pesquisador
das relações entre Política e Economia e Visiting Researche Associate da
Universidade de Oxford.