sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Em tempos de criança esperança: Carta aberta a Renato Aragão

Por Eliane Sinhasique
Rio Branco, Ac – 23 de agosto de 2007

Há alguns meses você vem me escrevendo pedindo uma doação mensal para
 enfrentar alguns problemas que comprometem o presente e o futuro de muitas crianças brasileiras. Eu não respondi aos seus apelos (apesar de ter gostado do lápis e das etiquetas com meu nome para colar nas correspondências) porque achei que as cartas não deveriam ser endereçadas a mim.

 Agora, novamente, você me escreve preocupado por eu não ter atendido as suas solicitações. Diante de tanta insistência, me senti na obrigação de parar  tudo e escrever-lhe uma resposta.
 Não foi por "algum" motivo que não fiz a doação em dinheiro solicitada por você. São vários os motivos que me levaram a não participar de sua campanha altruísta (se eu quisesse, poderia escrever umas dez páginas sobre esses motivos). Você diz, em sua última carta, que enquanto eu a estivesse lendo, uma criança estaria perdendo a chance de se desenvolver e aprender pela falta de investimentos em  sua formação.
Didi, não tente me fazer sentir culpada. Essa jogada publicitária eu conheço muito bem. Esse tipo de texto apelativo pode funcionar com  muitas pessoas, mas  comigo não.
 Eu não sou ministra da educação, não ordeno as despesas das escolas e nem posso obrigar o filho do meu vizinho a freqüentar as salas de aula. A minha parte eu já venho fazendo desde os11 anos, quando comecei a trabalhar na roça para ajudar meus pais no sustento da família. Trabalhei muito, e te garanto trabalho não mata ninguém. Estudei na escola da zona rural, fiz supletivo, estudei à distância e muito antes de ser jornalista e publicitária eu já era uma microempresária. Didi, talvez você não tenha noção do quanto o governo federal tira do nosso suor para manter a saúde, a educação, a segurança e tudo o mais  que o povo brasileiro merece e precisa. Os impostos no Brasil são altos demais, sem falar nos impostos embutidos em cada alimento, em cada produto que preciso comprar para a minha família.
Didi, eu já pago pela educação duas vezes: pago pela educação na escola pública, através dos impostos, e na escola particular, mensalmente, porque a escola pública não atende aos estudantes brasileiros com um ensino de qualidade que, acredito, meus dois filhos merecem. Não acho louvável, portanto, recorrer à sociedade para resolver um problema que nem deveria existir pelo volume de dinheiro arrecadado em nome da educação e de tantos outros problemas e necessidades sociais.
O que está acontecendo, meu caro Didi, é que os administradores dessa dinheirama toda não têm a educação como uma prioridade. O dinheiro está saindo pelo ralo, está sendo jogando fora ou muito mal aplicando. Para você ter uma idéia, na minha cidade, cada refeição de um presidiário custa para  aos cofres públicos R$ 3,82 (três reais e oitenta e dois centavos), enquanto que a merenda de uma criança na escola pública custa R$ 0,20 (vinte centavos). O governo precisa rever suas prioridades, você não concorda?
Você diz também em sua carta que não dá para aceitar que um brasileiro se torne adulto sem compreender um texto simples de uma mensagem ou conseguir fazer uma conta de matemática. Concordo com você. É por isso que sua carta não deveria ser endereçada à minha pessoa. Deveria se endereçada, sim, ao Presidente da República. Ele é "o cara". Ele tem a chave do cofre. Eu e mais milhões de pessoas só colocamos o dinheiro lá para que ele faça o que for necessário para melhorar a qualidade de vida das pessoas.
No último parágrafo da sua carta, mais uma vez, você joga a responsabilidade para cima de mim dizendo que as crianças precisam da "minha doação", que a "minha doação" faz toda  a diferença. Lamento discordar de você profundamente, meu caro Didi. Com o valor da doação mínima, de R$ 7,00, eu posso comprar 1 pacote de 5 quilos de arroz para alimentar minha família por um período de
 10 dias, ou posso comprar pão para o café da manhã por 5 dias.
Didi, você pode até me chamar de muquirana, não me importo, mas R$ 7,00 eu não vou doar. Minha doação mensal já é muito grande. Se você não sabe, eu faço doações compulsórias mensais de 27,5% de tudo o que ganho e posso te garantir que essa grana, se ficasse comigo, seria muito melhor aplicada na qualidade de vida da minha família.  Outrossim, você sabia que para pagar impostos eu tenho que dizer não para quase tudo que meus filhos querem ou precisam? Meu filho de 12 anos, por exemplo, quer praticar tênis e eu não posso pagar as aulas, que são caras demais para nosso padrão de vida. Você acha isso justo?
 Acredito que não. Você é um homem de bom senso e saberá entender os meus motivos para não colaborar com sua campanha pela educação  brasileira.
Outra coisa, Didi, mande uma carta para o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, pedindo para ele selecionar melhor os professores.
Só escolher quem de fato tem vocação para o ensino. Melhorar os salários desses
 profissionais também funciona para que eles tomem gosto pela profissão e vistam, de fato, a camisa    da educação. Peça para ele também exigir que as escolas tenham horário integral, escolas em que as crianças possam, além de ler, escrever e fazer contas, também desenvolver dons artísticos, esportivos e habilidades profissionais. Dinheiro para isso tem, sim! Diga para ele priorizar a educação e utilizar melhor os recursos obtidos com a arrecadação de impostos no Brasil.
Bem, meu caro Didi, você assina suas cartas com o pomposo título de "Embaixador Especial do UNICEF para as Crianças Brasileiras", e eu vou me despedindo assinando também com meu título não tão pomposo.
Atenciosamente,
 Eliane Sinhasique - "Mantenedora Principal dos Dois Filhos que Pari".
P.S.: Não me mande outra carta pedindo dinheiro. Se você mandar, serei obrigada a ser mal educada: vou rasgá-la antes de abrir e, em pensamento, mandá-lo à puta que o pariu.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Estado significa opressão

Por: Caciji Paulo (Extraído do Jus Brasil)
O Estado é o responsável pela opressão do cidadão e de forma ditatorial estabelece uma série de determinações ditas "civilizadas" para impor a vontade de uma minoria sobre uma maioria.
Não é a forma de governo que é opressiva. É a existência de um governo que é opressivo.
Tanto nas ditaduras, democracias, teocracias, monarquias ou oligarquias, o cidadão comum não participa das decisões de como quer viver. Uns poucos eleitos determinam que um determinado estilo de vida é evoluído e impingem esta norma aos demais.
A diferença entre as teorias capitalista e socialista não libertam o cidadão do jogo de um Estado todo poderoso determinando o que é certo e o que é errado.
O dilema materialismo/religiosidade como forma de expressão do Estado ao invés de libertarem a consciência do cidadão, o escraviza na tirania daqueles que detém ou querem chegar ao poder. Tanto os Estados laicos como os teocráticos são idênticos na dominação do cidadão, só diferem na retórica de apresentação ideológica, - um oprime em nome de uma divindade e outro com a bandeira da democracia.
O que determina que um Estado seja ditatorial ou democrático é a forma com que ele oprime a Nação. O primeiro usa até a força física para inibir o que possa extinguir sua força e o segundo usa a doutrina democrática para a mesma finalidade. E, para justificar o uso de uma dessas armas, todas as formas de governo são coniventes em fazer crer que o cidadão aprende pelo amor ou pela dor e alternam estes instrumentos na condução dos desígnios do Estado.
A opressão pela imposição da força, de certa forma, é mais autêntica; pois é mais visível, menos maquiada e não consegue dominar o foro íntimo do cidadão. A doutrina democrática é maliciosa, invade a inteligência de cada indivíduo e o manipula para mantê-lo em um torpor intelectual que impede uma visão realista daquilo que ele almeja.
O primeiro passo, para a dominação da doutrina democrática, é criar denominações que catalisem reações comportamentais que influenciem no arbítrio do individuo. É o conto da roupa nova do rei, só os puros e inteligentes conseguem enxergá-la; os impuros e estúpidos não têm esta capacidade.  Assim, um legalista, portanto um cidadão de bem não contesta a validade de uma lei, que, afinal, foi votada pelos seus legítimos representantes. Quem não respeita o soberano império da lei é um marginal, um detentor de alguma sociopatia, e precisa de algum tipo de tratamento para se adequar aos desígnios do Estado.  É certo marginalizar, punir ou declarar doente e submeter a alguma terapia quem acha uma lei injusta?
O que é ser puro, inteligente, legalista, cidadão de bem e legítimo representante? Ou, o que é ser impuro, estúpido, marginal ou sociopata? Porque o império da lei é soberano? Estas palavras não são usadas de forma irrefutáveis, são contextualizadas dentro de uma retórica usada para aprisionar o indivíduo em um comportamento imposto pelo Estado.
democracia é um fundamento que afronta a liberdade humana, é uma figura retórica sem um significado real, um substantivo abstrato. Se fossemos conceituar o significado contextual desta palavra chegaríamos à conceituação de ditadura da maioria. Por exemplo: em uma democracia teórica, se houvesse uma comunidade de 100 pessoas para decidir a construção ou não de uma ponte para atravessar um rio e, 51 nadadores decidissem que não em detrimento a 49 que não soubessem nadar, a ponte não seria construída. Isto é liberdade?  Mas, na realidade a doutrina democrática não é usada como uma justificativa legal para a usurpação do direito e do dever do cidadão de participar dos destinos da Nação? Sendo assim, democracia e usurpação não acabam tendo o mesmo significado?
Na democracia, o cidadão é condicionado para optar e não para participar. Em uma lista de nomes, ele opta quem vai governar os destinos da Nação, mas, não participa. Transfere sua cidadania para um desconhecido que conquistou sua preferência por meio de um discurso retórico cheio de promessas que dificilmente serão cumpridas.
A soma destes desconhecidos, que recebem de cada cidadão um mandato para representá-lo, compõe o que chamamos de Estado e decidem o que é melhor para a Nação (ou para eles mesmos) sem uma participação expressa dos eleitores, pois estes se pronunciaram uma só vez, quando votaram, e, não existe nenhuma garantia de que os eleitos cumprirão com os anseios de quem lhes entregou o mandato.
A garantia que o cidadão pode punir os desmandos de seus representantes pelo voto é uma mentira mal-intencionada. O tempo que se leva para extirpar o mau político não consegue evitar os desastres que ele possa causar.
A dicotomia entre o Estado e a Nação é inevitável, pois os detentores dos mandatos, se agirem dentro do estrito cumprimento do que acreditam ser seu dever, tentam interpretar os anseios do povo. Mas esta interpretação é deturpada pelas crenças e vivências individuais de cada um deles, e não refletem necessariamente aquilo que os seus eleitores pensam. Agora, quando estes agentes usam o mandato para benefícios pessoais, já não existe somente uma separação e sim a criação de duas entidades distintas e antagônicas. - O Estado de um lado e a Nação de outro lado-.
Nas civilizações antigas, quando uns poucos tinham tempo para exercer atividades intelectuais e a maioria absoluta tinha como prioridade a sobrevivência, era necessário que a minoria intelectualizada dirigisse a maioria. O Estado era o cérebro e a Nação o corpo. Bastava que os governantes agissem no interesse do povo, e a lucidez de poucos beneficiaria os anseios da maioria.
Na atualidade, a maioria das pessoas é alfabetizada, as mulheres não são mais propriedades dos pais ou dos maridos, são seres independentes, intelectualizados e com existências e perspectivas vivenciais individuais, um pré adolescente tem a oportunidade de acesso a muito mais informações de que todos os pensadores gregos tiveram em toda a vida, os anseios do povo não se restringem em estar alimentado e ter um teto e vestes para se abrigar das intempéries. Apesar de não ter uma clareza na consciência, cada indivíduo quer exercer de maneira efetiva a sua liberdade, e com isso, participar plenamente dos destinos da humanidade.
O obstáculo para a plenitude do indivíduo é a pregação nociva de que o Estado é o representante do cidadão. Na verdade, o Estado é a garantia de que uma minoria, privilegiada por uma doutrina ultrapassada e demagógica, determine a maioria como agir para ser um cidadão probo, inteligente e quantos tantos outros adjetivos que possam ser necessários para comprar suas consciências.
O cidadão é o legitimo representante da Nação
Para formar um cidadão pleno não é necessária uma doutrina retórica que constranja o indivíduo a agir conforme o que alguns acham correto. É preciso dividir a responsabilidade de crescer como Nação e garantir que todos tenham o direito e dever de construir e usufruir daquilo que for construído. E a única forma de ser uma Nação é agindo em prol do bem comum.
Quando cada indivíduo se conscientizar que seus atos podem beneficiar ou prejudicar o bem estar de todos, e que, por isso, é responsável pela sua comunidade, estarão criados os alicerces de uma Nação na acepção mais nobre desta palavra.
Os cidadãos organizarão um sistema em que cada grupo de, digamos, mil indivíduos, que convivam por proximidade geográfica (ex: bairro), escolherão entre eles, doze porta vozes. Estes, por sua vez, se reunirão em grupos de, talvez, cem e escolherão doze representantes que participarão de um grupo determinado de pessoas escolhidas da mesma maneira. E sucessivamente, como se fosse uma pirâmide, até chegar ao topo, onde teria doze escolhidos para o conselho de administração, e não um governo. E estes serão os responsáveis pela administração (dos anseios do povo), do patrimônio e do planejamento da Nação.
Os representantes, de qualquer escalão, poderão, a qualquer momento, ser substituídos, de acordo com a vontade da maioria dos seus representados, pois o poder pertence ao povo e pelo povo é exercido. Ou seja, a vontade popular é soberana o tempo todo e não a cada eleição.
A Garantia dos direitos e deveres
Não está na hora de detectarmos quais indivíduos são úteis, quais são inúteis e quais são nocivos para a construção de uma Nação justa? Os úteis não seriam os verdadeiros Cidadãos e, por isso, teriam a plenitude dos direitos preservados? Os inúteis não deveriam ser ajudados a se tornarem úteis e, enquanto não o fossem terem somente os direitos básicos assegurados? E os nocivos, não teriam que perder todos os direitos e serem banidos do convívio social?
As regras de convivência devem assegurar os direitos e os deveres individuais para que todos tenham oportunidade do pleno exercício da cidadania. O mérito por atos que melhorem a qualidade de vida dos concidadãos ou o crescimento da Nação devem ser reconhecidos e revertidos em algum tipo de benefício. Os atos que prejudicam a sociedade ou, um determinado indivíduo injustamente, serão coibidos.
A lei não pode constranger a liberdade do cidadão, deve garantir os direitos básicos da coletividade e dos indivíduos de forma inequívoca. A ação penal não é uma vingança da sociedade contra quem violou seus direitos (criminosos), mas, tem que assegurar à sociedade que, os violadores de suas regras não vão reincidir nesta prática. Os limites para garantir que um transgressor não voltará a infringir as normas da Nação devem ser proporcionais ao delito.
É óbvio que manutenção dos direitos dos infratores não pode competir com o direito à saúde, educação e bem estar das crianças e cidadãos. Se o custo financeiro para sustentar a “dignidade” do transgressor for maior que o benefício de um cidadão ao acesso a saúde, ou de uma criança a preparar-se para a plena cidadania por meio da educação, é porque existe um erro nas prioridades. É um absurdo que quem participe ou represente o futuro da Nação morra por falta de médico, tratamento ou remédio e uma pessoa nociva a convivência social tenha esses direitos assegurados. Afinal, quem abdicou de sua dignidade foi quem, desdenhando do direito alheio, transgrediu as normas que asseguram o bem estar do seu próximo.
Desservir a educação ou a saúde para manter os delinqüentes com ditos “direitos humanos” não deveria ser revisto?
É evidente que motivos psicológicos, psiquiátricos ou outros que levaram o indivíduo a transgredir devem ser estudados. Mas com o objetivo de buscar mecanismos que inibam situações que produzam estas motivações e, assim, evitar que outros indivíduos transgridam pelos mesmos motivos. Mas, não é óbvio que a tolerância baseada nestes aspectos realimenta estas motivações e produzem novos transgressores?
A quantificação de como é prejudicial uma determinada infração deve ser a única medida para a ação repressora da Nação. O cargo, profissão, idade ou classe social pode explicar para o acadêmico as motivações do infrator, mas diminuem a nocividade do ato? Quem é assassinado por um adolescente fica ”menos morto” que  quem for assassinado por um adulto?
O infrator não tem que ser responsabilizado criminalmente e civilmente pelo dano causado? Quem mata ou incapacita um arrimo de família, além de cumprir a sua pena pelo crime, não deveria de assegurar que a família prejudicada mantivesse o padrão de vida e as perspectivas que teria se a vítima estivesse integra? Ou o ladrão, o destruidor de patrimônio alheio, além da pena, não deveria de indenizar integralmente as vítimas inclusive pelos prejuízos indiretos (lucro cessante, perda de oportunidade, inadimplência etc.)?
Colocar na cadeia um ladrão ou um estelionatário e não forçá-lo a restituir o prejuízo a vitima não pode parecer, para alguns, um bom investimento a longo (às vezes não tão longo) prazo?
Para cumprir com as responsabilidades cíveis o transgressor não deveria ter seu patrimônio seqüestrado ou, na impossibilidade disso, trabalhar e ter o fruto do seu trabalho revertido aos prejudicados até o limite do prejuízo, independente do tempo da condenação criminal?
O servidor público que desvia verbas para finalidades diversas, não pode, indiretamente, estar condenando à morte um paciente que não receber o remédio ou o tratamento adequado por falta de verbas? E se sim, ele não deveria ser réu de homicídio? O ilícito e o desonesto não deveriam ser sinônimos?
A lei deve garantir os direitos individuais, proteger a Nação e regular as relações entre os cidadãos. Não se podem conceber leis que beneficiem pessoas ou grupos em prejuízo dos diretos dos outros. O direito é lógico e pontual. O primeiro direito individual é a vida. A vida de dois é mais importante que a vida de um. Será que podemos permitir que o direito de manifestação de muitos tire o direito à vida de um ou que o direito a recreação de muitos interfira no de saúde de poucos? Ora, vida é vida, saúde é saúde e recreação é recreação. A relação de coisas iguais é pontual, a relação de coisas diferentes tem que ser hierárquica. O que vale mais: a vida, a saúde, o direito de ir e vir? Isto é a sociedade que deve decidir. Na história houve sociedades em que a honra era mais importante que a vida. Um pensador afirmou que daria a vida pelo direito de qualquer pessoa declarar o que quisesse, mesmo se ele não concordasse com o que foi declarado. Os caminhos da Nação devem ser decididos pelos cidadãos.
Interpretar as leis de forma retórica para obter benefícios ilegítimos em detrimento de diretos alheios não é uma violência contra os prejudicados e, conseqüentemente, contra a Nação?
O investimento que a Nação possa fazer no desenvolvimento de um individuo não teria que objetivar um retorno para a coletividade? O povo pagar por meio dos impostos a formação de um médico, cujo atendimento ser-lhe a negado não é antiético? Não seria justo que todos que se formassem em uma profissão liberal, à custa da Nação, trabalhassem por um período (quiçá quatro anos) como funcionário público, para devolver ao povo o custo da sua formação?
Os ganhos pecuniários por um indivíduo não deveriam ser limitados? O fato de uma pessoa ser um estereótipo de beleza ou ter habilidade artística ou desportiva, o torna merecedor de regalias inatingíveis até mesmo por outros gênios úteis para a humanidade? Um educador que promova a emancipação dos seus educandos ou um pesquisador que descubra a cura de uma doença é menos importante que o artista, o atleta ou a modelo?
Estas e outras questões deverão ser esmiuçadas pela sociedade para que seja encontrado um rumo que a Nação tomará para se tornar um reflexo vivo dos seus cidadãos.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Botão iniciar no windows 8 (Vídeo)

A maior reclamação de quem compra um computador com windows 8 é a falta do botão iniciar na tela de trabalho. O problema acabou. Esta postado logo abaixo um video muito bem explicado sobre como colocar um botão iniciar no windows 8, o programa é simples, fácil de instalar e bom.
O nome do programa é Classic Shell e pode ser baixado diretamente do Baixaki.  Este é o link:  http://www.baixaki.com.br/download/classic-shell.htm


(Video) Piranhas/Alagoas: Encantos da natureza e da Historia


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Discurso Político: Os vigaristas

ANTES DA POSSE:
O nosso partido cumpre o que promete.
Só os tolos podem crer que
não lutaremos contra a corrupção.
Porque, se há algo certo para nós, é que
a honestidade e a transparência são fundamentais.
para alcançar os nossos ideais
Mostraremos que é uma grande estupidez crer que
as máfias continuarão no governo, como sempre.
Asseguramos sem dúvida que
a justiça social será o alvo da nossa ação.
Apesar disso, há idiotas que imaginam que
se possa governar com as manchas da velha política.
Quando assumirmos o poder, faremos tudo para que
se termine com os marajás e as negociatas.
Não permitiremos de nenhum modo que
as nossas crianças morram de fome.
Cumpriremos os nossos propósitos mesmo que
os recursos econômicos do país se esgotem.
Exerceremos o poder até que
Compreendam que
Somos a nova política.

DEPOIS DA POSSE:
Basta ler o mesmo texto acima, de baixo para cima, linha a linha.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Ditadura democrática ou democracia coronelista?

(Por Ana Cunha)

Seja qual for a resposta, nenhuma me satisfaz...
É que hoje acordei me questionando qual o tipo de política estamos vivendo. Em qual gostaria de viver? Qual seria a ideal?
A trilha sonora para os meus pensamentos viria na voz de Renato Russo e eu, assim como ele, perguntaria “Que país é esse?”. Mas os meus questionamentos nem chegam ao macro, nem passam perto daquilo que estamos vendo pela televisão, de pessoas invadindo grandes avenidas em protesto afirmando que o “Brasil acordou”.
Não sei se acredito que acordamos de fato.
Não sei se acredito, inclusive, que vivemos em uma democracia, já que alguma das características principais de governos democráticos é o direito a liberdade de pensamento, liberdade de expressão e, principalmente, a liberdade de escolha. Ou estou enganada?
Fato é que, a priori, a democracia seria o governo do povo, pelo povo e para o povo. Mas, isso acontece na prática?
Quem lembra do início do período republicano no Brasil quando nós, povo brasileiro, vivíamos debaixo de um sistema chamado popularmente de coronelismo? O sistema, caracterizado pelo mando e desmando dos coronéis, detentores de posses e riquezas, tinha algumas peculiaridades, principalmente no que tange o período eleitoral.
Os coronéis faziam prevalecer suas vontades e seus interesses políticos, nem que pra isso fosse preciso utilizar da violência física e moral. Assim, uma das primeiras características desse período da república brasileira é o voto de cabrestro – onde os coronéis compravam votos para seus candidatos ou os trocavam por benfeitorias.
Os locais em que prevalecia esse tipo de política são chamados de currais eleitorais. Lá, além da compra de voto, os coronéis também praticavam o que hoje chamamos de assédio moral, colocando seus capangas nos locais da votação para intimidar os eleitores a votarem, não de acordo com a sua vontade, mas de acordo com os interesses políticos dos próprios coronéis.
Outra característica intrínseca ao período do coronelismo é a fraude eleitoral, onde votos eram alterados, urnas sumiam e documentos eram falsificados para que uma única pessoa pudesse votar diversas vezes em uma eleição. Aqui, pasmem, até morto votava.
Segundo Francisco de Assis Silva e Pedro Ivo de Assis Basto, no livro História do Brasil: Colônia, Império e República, "o coronelismo, fenômeno social e político típico da República Velha, embora suas raízes se encontrem no Império, foi decorrente da montagem de modernas instituições - autonomia estadual, voto universal - sobre estruturas arcaicas, baseadas na grande propriedade rural e nos interesses particularistas."
Quantas dessas características citadas acima são mantidas até hoje, apesar das transformações que a nossa sociedade passou?
Cito também o período a qual chamamos de ditadura, onde os direitos do cidadão foram cerceados, tolidos. Sem liberdade de ir e vir, sem liberdade de livre manifestação de pensamento, quanto mais liberdade de imprensa.
Hoje, chego a me questionar sobre quem são os verdadeiros filhotes da ditadura. E vejo que, na verdade, até aqui acreditei em uma coisa que não existia. Acreditei em certos ideais políticos que, infelizmente, não existem.
Nem espectros políticos. Direita, esquerda e centro é conversa para boi dormir. No fundo, no fundo, o que existe (e se existir!!!) é oposição e situação. Para uns tudo, para outros nada.
As situações que tenho visto e vivido me fazem desacreditar na política. Certo estava quem disse que a política corrompe o homem. Mas somente aquele que se deixa corromper (comigo não, “roda viva”!).
Seja qual for o tipo de política que estamos vivendo, nenhuma me satisfaz.

Sarney...Renan...Sarney...Renan...Sarney...Renan... ...

http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/files/2013/02/REnan-com-Sarney-Geraldo-Magela.jpg

http://www.esmaelmorais.com.br/wp-content/uploads/2013/02/charge020213.jpg

Um dia na História do congresso. Mas parece que é hoje.

Ana Araujo
De Jesus

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Quando a renovação não renova nada

As revoluções ou pequenas alternâncias de comando costumam pegar de surpresa as estruturas antigas, que esperavam se manter perpetuamente no poder. Mas o novo sempre é bom?
 
Diário da Manhã - Por Welliton Carlos
 
A política – de tempos em tempos – entra em crise. Muitas vezes os ciclos chegam ao fim e começam então novos. Quase sempre as mudanças ocorrem por iniciativa popular: o povo decide mudar de rumo e elege novidades.
As revoluções ou pequenas alternâncias de comando costumam pegar de surpresa as estruturas antigas, que esperavam se manter perpetuamente no poder. O que mais se torna evidente, entretanto, é a mesmice do discurso do ‘novo’ – um dos principais clichês das tentativas de mudança. Não raro, a história mostra que muitas vezes o discurso categorizado como antigo permanece atual – quando não é sequer verdadeiramente aplicado. Por sua vez, conforme exemplos da história, o ‘novo’ contempla ações pouco joviais e até muitas vezes retrógradas.
Sondagens de opinião pública recentes demonstraram um cenário de rejeição ao antigo. Tanto no Brasil quanto em Goiás impera uma interpretação: a população quer o ‘novo’ nas próximas eleições. A rejeição é evidente, mas que evidência temos, afinal, de que o novo é melhor do que o velho? Na última vez que o Brasil buscou o ‘novo’, os brasileiros escolheram Fernando Collor de Melo para presidir o País – escolha considerada por muitos como um dos maiores erros da história do País.
Collor foi o paradigma do novo. Logo na campanha eleitoral, desqualificou o que seria o ‘velho’. Aos brasileiros apresentou o Plano Brasil Novo, atacou simbolicamente carros do passado como o simpático Fusca e disseminou a ideia de que tudo no País estava velho e corrompido. Com uma equipe de ministros completamente sem expressão pública, mas todos novos, ele logo piorou a situação da política e economia brasileira a ponto de ser retirado do cargo de presidente. E Collor não era nada novo nas ideias: era um representante das elites, empresário, ex-prefeito biônico (escolhido pela ditadura) de Alagoas, filho de um ex-ministro e uma mente velha e adoecida dentro de um jovem corpo.
O novo costuma ser exigido quando o poder Executivo entra em crise, perde o controle dos anseios da massa ou se transforma em objeto de desejo das elites que não integram plenamente o poder. Foi assim em Roma, quando um grupo de conservadores optou por assassinar o já velho Júlio César – considerado antigo por Marco Bruto, político conservador e seu assassino.
Na Roma antiga, jovens imperadores quase sempre se caracterizaram por abusos. Nero, por exemplo, gostava mais de ser famoso do que de atuar na gestão.  Era acima de tudo imoral. Com o discurso de que era jovem e eterno, fez sexo com a mãe e depois mando matá-la. Vestiu-se de mulher e tocava a lira como um guitarrista em Woodstock. Aos 30 anos, se matou, deixando o exemplo de como não ser um administrador. Mas permanece a pergunta: Nero foi popular? Sim, um dos maiores de seu tempo.
O novo da política costuma se contrapor ao velho. No governo Sarney, que se encerrou em 1989, aconteceu exatamente isso. O candidato teoricamente mais forte, experiente e preparado era o líder peemedebista Ulisses Guimarães. Todavia, os cabelos brancos e a voz idosa e grave perderam no embate jovial com o lutador de karatê Collor de Melo.
Goiás
Dez anos depois, Goiás teria também um enfrentamento: a velha política de Iris Rezende (PMDB) e o ‘Tempo Novo’ de Marconi Perillo (PSDB) se enfrentaram nas urnas. Os resultados foram diferentes do cenário nacional.  As eleições goianas são citadas como paradigma do novo em inúmeros livros de estudos eleitorais. Trata-se de um dos argumentos de que o novo pode dar certo.
Logo que assumiu o governo de Goiás, Marconi temperou sua equipe de governo com gestores experientes e novatos. Realizou então uma ampla reforma administrativa e implantou programas sociais realmente novos e inéditos – caso do Renda Cidadã e Bolsa Universitária. A população aprovou as novas medidas e Perillo conseguiu outras duas reeleições. Hoje Goiás é bem diferente de antes da escolha do novo: o Estado foi o que mais cresceu nas últimas décadas, com recordes de industrialização e empregos. Nem sempre, portanto, o ‘novo’ significa fracasso de políticas econômicas ou uma gestão corrupta e amadora.
Onde está o novo?
No Brasil, após as manifestações de junho deste ano, a ex-candidata à presidenta e ex-senadora Marina Silva, antes PT e PV, ocupou rapidamente o espaço do ‘novo’. Mas como Collor de Melo, ela não é realmente nova.
Como senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina pouco fez de diferente do que políticos tradicionais. E como Fernando Collor, que criou o estranho partido PRN, ela inventou a legenda A Rede – tanto um como o outro pregam a ‘renovação’ nacional e foram criados á reboque de uma disputa eleitoral.
Marina não é sequer nova na vida pública. Ela atuou no governo federal e no Senado. O conjunto de projetos de lei que apresentou no Congresso Nacional não diferencia muito sua atuação, por exemplo, de Collor de Melo – hoje senador da República. Marina também não colocou em prática ações avançadas no meio ambiente quando foi ministra da primeira gestão de Lula. No geral, apenas cumpriu um papel dentro do sistema.
Entretanto, sua própria imagem de fragilidade e honestidade a coloca como a segunda colocada nas pesquisas de opinião pública, a aproximando da líder Dilma Rousseff. No caso, o novo é pouco diferente do velho representado por Dilma - com opiniões pessoais mais avançadas do que Marina em diversos segmentos, como religião, políticas para a mulher e economia, por exemplo.
Dificuldade
Goiás tem dificuldades em encontrar o novo. E o motivo é simples: usa-se a fórmula desgastada de se perpetuar no poder por meio de parentes. A maioria dos jovens políticos do Estado é composta de filhos de velhos políticos. Eles não simbolizam avanço. Ao contrário, demonstram o uso de uma fórmula antiga para a entrada na política: o uso da imagem e competência do pai. Assembleia Legislativa e Câmara Municipal de Goiânia estão repletas de ‘velhos’ na casa dos 20 e 30 anos. Em alguns casos, os filhos representam os pais que foram justamente afastados da política por conta de casos de corrupção ou prática de crimes.
Ao contrário da eleição presidencial, inexiste em Goiás uma figura que catalise a imagem do novo, fato que atordoa os grupos políticos. E o motivo parece ser exatamente a falta de interesse em realmente quem é novo e também representa o novo.
Quando Marconi Perillo surgiu no cenário político de Goiás, de fato, renovou o Estado: inseriu em Goiás uma agenda de eventos culturais (Fica, Canto da Primavera), criou um centro cultural, investiu na criação de faculdades, fortaleceu a economia com ações diferentes e inusitadas (como os incentivos arrojados do setor fiscal), lançou Goiás no exterior, atraindo investimentos. O ‘Tempo Novo’, assim, mudou a rota de políticas e ações do Estado.
Antes dele, apenas Mauro Borges havia chegado ao mesmo conceito de renovação de gerenciamento público. E Mauro Borges venceu as eleições de 1960 contra o conceito velho lançado pela própria família (Pedro Ludovico e Juca Ludovico). Todavia, ele não venceu as eleições como ‘novo’, mas como a continuidade do pai velho – que deu certo ao substituir a política da Goiás velha, de Caiados e Bulhões.
Mauro inaugurou no Brasil o primeiro governo planejado, com o estabelecimento de controle de receitas, despesas, proposição e cumprimento de metas. Governador de Goiás entre 1961 e 1964, optou por escolher técnicos e universitários para a gestão do Estado. Em uma época desglobalizada, foi até a China para tentar estreitar laços econômicos com o país que hoje mais celebra acordos comerciais com o Brasil e seu Estado.
Mauro venceu as eleições apoiado pelo pai, mas governou sem dar muitos ouvidos ao que ele dizia. Por isso foi inovador. Daí que na política, é melhor analisar as ideias e não a jovialidade do político ou sua pouco experiência com as coisas públicas. Existe uma grande diferença entre Mauro Borges e Collor de Melo, quando se busca na história  o que os dois fizeram em suas gestões.  A busca do ‘novo’ é um embuste do marketing político quando não consegue diferenciar o candidato ou fazê-lo uma real alternativa de poder.
Os riscos do apelo ao novo
O novo nem sempre se revela melhor do que o velho. Na história não faltam equívocos para atestar que muitas vezes erramos ao optar por novidades desconhecidas ou aventureiras
Fernando Collor de Melo
Venceu as eleições em 1989 como o ‘novo’. Mas foi prefeito biônico de Alagoas durante a ditadura. Criou um partido ‘novo’ apenas para disputar as eleições. Disse que iria renovar o Brasil. Lutava caratê, fazia cooper e gostava de se mostrar radical. Na administração pública, entretanto, foi a maior negação da história do País.
Adolf Hitler
O líder nazista era um contraponto ao velho líder alemão Hindenburg. Hitler assumiu o comando da nação, aos 40 anos, mas antes já havia liderado inúmeras ações políticas no País.  Implementou ações consideradas ‘novas’ na política, como o congelamento de preços e a renovação dos símbolos da cultura alemã.
Calígula
O terceiro imperador de Roma entrou para a história como péssimo gestor, conhecido pela  natureza extravagante e cruel. Foi assassinado pela guarda pretoriana aos 28 anos. Integra um rol de jovens imperadores que atrapalharam o desenvolvimento do Império Romano, cujo maior nome é Nero. Foi considerado um tirano demente, cuja maior vocação era participar de orgias e se embebedar.
Jânio Quadros
Não chegou jovem no poder, mas aos 47 anos. Apresentou, entretanto, a imagem de novidade nas disputas eleitorais de 1960. Ficou poucos meses no cargo e renunciou – em um dos episódios mais controversos da política brasileira. Ganhou as eleições com o mote “varre, varre vassourinha, varre a corrupção”. Teve apoio da UDN – a legenda que reunia os filhos do coronelismo. Com o fim da política Café com Leite e a República de 1930, os filhos dos coronéis migraram para as capitais e passaram a integrar a UDN. A legenda jamais deixou o conservadorismo e influenciou Quadros, cujo governo é lembrado por impedir briga de galo.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Padre Cícero, entre a política e a religião

A vida do mais amado e controvertido mito religioso do sertão que, para muitos, foi um santo; para outros, um “coronel de batina”
Por José Paulo Borges
Tudo começou com um sonho de um jovem pároco sertanejo de menos de 30 anos de idade, estatura pequena, pele branca, cabelos claros e inacreditáveis olhos azuis. No sonho, o próprio Jesus Cristo, rodeado pelos 12 apóstolos, surge ao padre e conta sua mágoa com a humanidade. Depois, aponta para um punhado de nordestinos maltrapilhos e descalços, provavelmente fugidos da seca, e ordena ao padre: “Quanto a ti, toma conta deles!” Impressionado, o padre decide se fixar definitivamente em Joaseiro (grafia utilizada à época), no sertão do Cariri, interior do Ceará – na época, um arraial miserável com 40 ou 60 casas de taipa cobertas de palha, habitado por uns “cabras” desordeiros e desregrados. Era 1872. Com o tempo, o trabalho do padre junto àquele povo foi dando resultado, posto que a todos se dedicava. E, aos poucos, Joaseiro foi se transformando num povoado devoto e próspero.
Há quem acredite que Cícero Romão Batista, o padre do sonho, até hoje zela não só por Juazeiro do Norte, situada a cerca de 530 quilômetros de Fortaleza, com pouco mais de 250 mil habitantes – cidade que ele fundou –, como por Crato (121 mil habitantes) –, que o viu nascer em 1844. E uma imagem sua, de 27 metros de altura, se impõe, fincada no alto da serra do Catolé, na parte denominada de Horto pela população desde o final do século XIX, em alusão ao Horto das Oliveiras, local onde Jesus Cristo teria passado suas últimas horas antes de ser preso e condenado à morte na cruz. Era no Horto que Cícero costumava descansar.
A vida do “Padim Ciço” dos romeiros e fiéis, mais amado e controvertido mito religioso do sertão – santo para uns, “coronel de batina” para outros –, pode ser dividida em dois atos distintos. No primeiro, as luzes se dirigem para o Cícero religioso e mostram cenas como as do pároco amargurado com o sofrimento de seu rebanho com a seca, o “milagre” da transformação em sangue da hóstia recebida pela beata Maria de Araújo durante a comunhão, os conflitos com o bispado cearense desencadeados pelo fenômeno, a proibição de rezar missa e, por fim, sua aclamação ainda em vida como santo pelos sertanejos.
No segundo ato, as luzes voltam-se para o Cícero político, em uma carreira que abraçou após ser proibido de ordenar. Em cena estão o personagem que foi prefeito de Juazeiro por quase 20 anos, sua eleição a vice-presidente (o equivalente a vice-governador) do estado do Ceará, o apadrinhamento a um exército de jagunços numa revolução armada que levou à derrubada do governo local e a aproximação com Lampião, de quem buscava apoio para combater a Coluna Prestes. Como se não bastasse, já perto do fim da vida, Cícero foi eleito deputado federal e ainda encontrou tempo para conceber um decálogo com preceitos ecológicos (leia o quadro) que, já naquela época, buscavam preservar a caatinga.
O religioso
“O nome do padre Cícero / ninguém jamais manchará, / porque a fé dos romeiros / viva permanecerá, / pois nos corações dos seus / foi ele um santo de Deus / é e pra sempre será.” Tema de incontáveis folhetos de cordel espalhados pelas feiras sertão afora, Cícero Romão Batista provavelmente passaria a vida inteira como mais um obscuro e anônimo pároco de aldeia. Afinal, nada de extraordinário acontecera a ele desde que chegara ao povoado. Nada, até aquela madrugada de sexta-feira, 6 de março de 1889. Durante a comunhão, bem cedo na madrugada, após uma noite de vigília e orações com outros fiéis na capela de Nossa Senhora das Dores, ao receber a hóstia pelas mãos de padre Cícero, a beata Maria de Araújo sentiu um gosto de sangue. Só aí notou que metade da hóstia consagrada (a outra ela havia engolido) sangrara ao contato com sua boca. Cícero guardou no sacrário o pano manchado de sangue entregue pela beata, e ordenou a ela que se mantivesse em silêncio.
O fenômeno se repetiu várias vezes na Quaresma até o dia em que a Igreja comemora a Ascensão de Cristo. Mesmo assim, Cícero manteve segredo, que durou até o dia em que monsenhor Francisco Rodrigues Monteiro, figura de grande prestígio, chamou o povo do Crato para uma peregrinação ao povoado vizinho de Joaseiro. Na capela, diante de 3 mil atônitos fiéis, mostrou o pano dizendo que o tecido estava impregnado com o sangue de Cristo. Médicos e autoridades foram checar o fenômeno e não encontraram nenhuma explicação natural. Joaseiro rapidamente se tornou um centro de romaria e devoção. De todos os lados, vinham pessoas para ver a beata e adorar o pano manchado de sangue.
Descontentes com a repercussão dos acontecimentos, as autoridades eclesiásticas do Ceará acusaram Cícero de heresia, proibiram o culto ao pano ensanguentado e impuseram uma retratação ao padre. O pároco viajou então a Roma, onde teve uma audiência com o Papa Leão XII. Absolvido, voltou com a permissão de continuar celebrando missa. Porém, dom Joaquim Vieira, bispo do Ceará, determinou que, enquanto não viesse de Roma o decreto de reabilitação, o sacerdote não poderia celebrar missa nem ministrar os sacramentos ou fazer sermões. De nada adiantou a proibição. Naqueles confins dominados por latifundiários e cangaceiros, onde vicejava uma religiosidade espontânea e mística, o mito do “Santo de Joaseiro” já estava consolidado.
Romeiros famintos e sedentos debandavam a Joaseiro vindos de todos os cantos do sertão, e Cícero atendia a todos. Além de orações e bênçãos, o padre encontrava soluções para tudo, de questões espirituais a atividades econômicas, de doenças a desavenças. “Em cada casa, um oratório; em cada quintal, uma oficina”, pregava com insistência. Dessa maneira conquistou o respeito daquela gente, que lhe atribuía qualidades de santo e profeta. Paralelamente, agindo com muita austeridade, cuidou de moralizar os costumes, acabando com os excessos de bebida e com a prostituição.
Agora, Cícero não era apenas padre, mas “padrinho” de toda aquela gente que chegava não apenas para pedir ajuda e que, mesmo sendo pobre, sempre trazia um regalo, uma esmola e um pouco de dinheiro, que deixavam sob a guarda do “Padim”. Alguns ofereciam animais, joias e até propriedades. Tudo para morar na terra santa de Joaseiro, sob a proteção do padre santo. Com um pouco de um e de outro, trazido pelos romeiros, Cícero constituiu um patrimônio respeitável e tornou-se o maior proprietário de terras da região.
Para alguns, já era um “coronel”, talvez o mais poderoso de todo o Cariri. Mas, para os romeiros, jamais deixou de ser o bom e venerável Padim Ciço, que sempre os protegia em suas necessidades, comprando terras e arrendando-as a eles, romeiros, para que tocassem suas vidas. E, assim, as coisas fluíam em Joaseiro, sem milagres e sem mistérios.
O político
Proibido de exercer as funções eclesiásticas, estimulado pelo seu prestígio ingressou na vida política. Com a elevação do povoado a município, foi nomeado pelo governador do Ceará, Nogueira Acioli, primeiro prefeito de Jua­zeiro. Como prefeito, estimulou a agricultura de subsistência, levou para o campo modernos descaroçadores de algodão e conseguiu que os trilhos da Rede de Viação Cearense chegassem ao Cariri. “Entrei na política a contragosto, porque não teve jeito”, disse certa vez.
Segundo o que corria à época, padre Cícero era oficialmente o prefeito, porém, quem de fato administrava Juazeiro era o doutor Floro Bartolomeu da Costa, espécie de eminência política do religioso. Em 1914, a Assembleia Legislativa do Ceará reuniu-se e, por maioria, reconheceu padre Cícero como 1º vice-governador do estado. Também foi eleito deputado federal. Ele não assumiu esses cargos “para não abandonar os fiéis”.
Em 18 de fevereiro de 1931, o jornalista Paulo Sarasate, do jornal O povo, de Fortaleza, entrevistou padre Cícero, na época com 87 anos, mas relativamente forte e falando com fluência. Ardoroso inimigo de concessões estrangeiras, declarou: “Em vez de se salvar o País com impostos e empréstimos, os dirigentes da pátria devem criar um novo ministério, destinado especialmente a desenvolver as nossas riquezas naturais, as grandes riquezas que Deus nos deu. Faça-se, pois, o Ministério das Minas e Florestas. É assim que se deve crescer, e não vendendo o país aos estrangeiros. Eles comem as bananas e nos atiram as cascas.” E continuou: “E, se for possível, criemos também o Ministério de Culto, Ensino, Ciência, Higiene e Bons Costumes, para melhor realizar a reconstrução moral do país.”
Padre Cícero foi a figura central de um movimento violento que fez muitas mortes, ocorrido no Ceará entre 1913 e 1914, chamado “Sedição de Juazeiro”. Com o pretexto de acabar com o fanatismo no sertão do Cariri, o então presidente do estado, Franco Rabelo, entrou em rota de colisão com o padre, exonerando-o do cargo de prefeito. Tropas enviadas por Rabelo ao Crato tentaram invadir Juazeiro do Norte, em combates que duraram um mês. Mas Juazeiro resistiu com uma força composta por beatos e cangaceiros fiéis a Cícero, comandadas por Floro Bartolomeu. O “Batalhão Patriótico”, como ficou conhecido, chegou a invadir Fortaleza em março de 1914, saqueando cidades pelo caminho. Naquele mês, o governo federal decretou intervenção no estado e destituiu o governador Rabelo, acabando com guerra.
Críticos mais contundentes afirmam que padre Cícero foi padrinho, amigo e protetor de Lampião. Tais vozes garantem que, em 1926, ele providenciou que o cangaceiro fosse nomeado capitão pelas autoridades federais, com o objetivo de combater a Coluna Prestes. Os cangaceiros, sabe-se, tinham forte religiosidade. Coincidência ou não, seu declínio político veio com a decadência do cangaço.
Romeiros, ontem e hoje 
Por causa das dores provocadas pela artrose em um dos joelhos, Terezinha de Jesus Alencar, de 74 anos, não fez em setembro, como tem acontecido nos últimos 20 anos, pelo menos, a caminhada a pé da Matriz de Nossa Senhora das Dores, no centro de Juazeiro do Norte, até o alto do morro do Horto – onde está a imagem de padre Cícero – juntamente com um grupo de romeiros de Petrolina, cidade do sertão pernambucano onde mora. “Fui de carro, mas mesmo assim fiquei feliz por participar de mais uma romaria”, conta. “Na verdade, já estou me preparando para o dia em que vou ter que ficar em casa, longe das romarias. Mas isso não tem importância, pois romaria a Juazeiro é uma coisa que está dentro do coração da gente. Ninguém tira essa alegria.”
Terezinha de Jesus é uma dentre os 2,5 milhões de pessoas que todos os anos chegam a Juazeiro em romarias. Já vão longe os tempos em que chegavam a pé ou no lombo de jumento. Muitos dos romeiros atualmente viajam em ônibus com ar-condicionado, ou chegam de avião. Neste caso, antes do desembarque no aeroporto da cidade, se encantam, olhando pela janela, com a estátua de padre Cícero reverberando ao Sol, no alto da Colina do Horto. Já em terra firme – embora predominem pousadas com preços variados –, podem optar por hotéis dotados de confortos inimagináveis pelos primeiros romeiros.
Naquela época, para serem recebidos por padre Cícero, os romeiros tinham de passar pelo crivo implacável da beata Mocinha. A maioria esperava de joelhos, rezando, a hora de ser chamado pela beata. Sem a interferência de Mocinha, que tudo podia e tudo mandava sob o teto que abrigava padre Cícero, nada se conseguia. Um ou outro romeiro protestava contra a demora, mas todos não viam a hora de beijar as mãos milagrosas, para eles, do “meu padrinho”.
Hoje, entre uma e outra missa, os romeiros podem passear pelo metrô de superfície da cidade, deliciar-se em um restaurante com um prato de macaxeira cozida na manteiga ou assistir gratuitamente, no Centro Cultural Banco do Nordeste, a montagens teatrais ousadas, como “Navalha na carne” do autor “maldito” Plínio Marcos

Fé: Em nome do poder


Os coroné, ainda tá aí!!


Reforma política divide políticos!


Fabiano Costa, Felipe Néri, Nathalia Passarinho, Renan Ramalho e Vitor Matos Do G1, em Brasília

geral_respostas_reforma_política (Foto: Editoria de Arte / G1)
Os impasses que, historicamente, levaram diversas propostas de mudanças no sistema político e eleitoral brasileiro para a gaveta já dividem os deputados federais indicados no dia 10 de julho para elaborar, em três meses, uma sugestão de reforma política. Enquete feita pelo G1 com 13 dos 14 parlamentares que irão integrar o grupo de trabalho aponta que temas como o financiamento de campanha e a forma de escolha de deputados e vereadores devem gerar disputas e discussões no Congresso Nacional.

O comitê da reforma política, criado na última quarta-feira (10), terá a tarefa de apresentar sugestões de projetos que podem modificar as regras das campanhas eleitorais, a maneira de votar, a forma de representação e a atuação dos políticos eleitos para o parlamento.
Na enquete, o G1 perguntou aos deputados do colegiado o que achavam sobre sete pautas: 1) financiamento de campanha; 2) reeleição para mandatos no Executivo; 3) sistema eleitoral para o Legislativo; 4) coligações entre partidos; 5) suplência no Senado; 6) voto secreto no Congresso; e 7) a forma de consulta à população, se por plebiscito ou referendo.
Apenas Cândido Vaccarezza (PT-SP) não respondeu ao questionário. Ele disse nesta segunda-feira (15) que não quer responder às perguntas.
Dos sete assuntos questionados na consulta, o modelo para financiar as campanhas é o que registrou a maior divergência entre os deputados do colegiado. Seis parlamentares se disseram favoráveis ao financiamento exclusivamente público.
"O meu ponto de vista pessoal é favorável ao financiamento público de campanha, porque acho que o grande vício do sistema eleitoral brasileiro é o poder excessivo do fator econômico no resultado das eleições”, ressaltou o deputado Leonardo Gadelha (PSC-PB), um dos que apoiam que as campanhas sejam financiadas apenas com dinheiro dos cofres públicos.
O financiamento público pode funcionar como um caixa 3"
Júlio Delgado (PSB-MG), ao rejeitar possibilidade de financiamento exclusivamente público
Na enquete, outros cinco parlamentares defenderam a manutenção do modelo atual, que permite o uso de recursos públicos – do fundo partidário – e privado – obtidos com doações de pessoas físicas e empresas – para, por exemplo, bancar gastos com propaganda, comícios e viagens.
"Eu tinha muita inclinação para financiamento público, mas no sistema que temos não vai funcionar. Não temos como controlar a quantidade de recursos que cada partido recebe nem como evitar que a pessoa que recebe financiamento público não vai receber recursos privados. O financiamento público pode funcionar como um caixa 3”, enfatizou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
No mesmo ponto da consulta, o deputado Sandro Alex (PPS-PR) defendeu somente doação privada de pessoas físicas. Já a líder da bancada do PC do B, Manuela D’Ávila (RS), prefere verba pública e privada somente de pessoas físicas, ou seja, vedando doações por empresas.
A consulta elaborada pelo G1 identificou apenas um ponto de consenso entre os parlamentares ouvidos pela reportagem. Para 13 deputados que participaram da enquete, o atual sistema de escolha dos deputados e vereadores deve ser modificado. O ponto de convergência, no entanto, acaba aí.
Na hora de definir a alternativa para substituir o modelo em vigor, o grupo se mostra rachado. Há parlamentares que apoiam o sistema proporcional com lista flexível, outros se mostram a favor da lista fechada definida pelo partido e também há defensores do sistema distrital, onde o eleitor vota no próprio candidato.
Atualmente, o sistema em vigor é o proporcional com lista aberta, pelo qual é possível votar tanto no candidato quanto na legenda, e um quociente eleitoral é formado, definindo quais partidos ou coligações têm direito de ocupar as vagas em disputa. Com base nessa conta, o mais bem colocado de cada partido entra.
Grupo defende mudar sistema de eleição para vereador e deputado, extinguir coligações e acabar com o voto secreto para cassações
Simulação
Com as opiniões adiantadas ao G1 por 13 integrantes do grupo de trabalho da reforma política, é possível se ter uma ideia do conjunto de projetos que podem ser apresentados ao final das atividades do comitê.
Segundo a enquete, além da mudança no sistema de votação para vereadores e deputados, o colegiado deve recomendar a extinção das coligações partidárias. Dez dos 13 deputados ouvidos pelo G1 se disseram a favor da modificação.
Outro ponto com adesão da maior parte dos congressistas do grupo é de pôr fim ao voto secreto nas cassações de deputados e senadores. Doze dos 13 parlamentares do colegiado querem que as votações para perda de mandato sejam abertas.
Os integrantes do colegiado ainda manifestaram a inclinação para alterar as atuais regras de suplência no Senado. Apenas dois dos 13 parlamentares foram contrários à mudança. Outros dois têm posições indefinidas.
Disputa interna
Idealizado como alternativa à proposta rejeitada pelos partidos de realização de um plebiscito para promover mudanças no sistema político e eleitoral, o recém-criado grupo de trabalho da reforma política terá de administrar uma crise interna antes mesmo de iniciar suas atividades.
Na última quarta (10), dia em que o comitê foi criado, o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), teve de suspender a instalação do colegiado por conta de uma divergência entre parlamentares petistas.
A liderança do PT havia avalizado a presença de Henrique Fontana, que relatou nos últimos dois anos projetos de reforma política, no grupo de trabalho. Porém, Alves surpreendeu os petistas na quarta ao indicar Cândido Vaccarezza para a presidência do colegiado.
Nesta segunda, Henrique Alves disse que o partido poderá ficar com dois representantes. Alves justificou a mudança de sua própria orientação ao fato de o PT possuir a maior bancada da Câmara. De acordo com o peemedebista, as demais bancadas da Casa terão apenas uma vaga no grupo.
O deputado do Rio Grande do Norte também anunciou nesta segunda que convidou o deputado Vaccarezza para ser o coordenador do colegiado que irá apresentar, em três meses, sugestões de mudanças no sistema político e eleitoral brasileiro. A confirmação do parlamentar paulista, entretanto, ainda depende do aval da cúpula petista. Na semana passada, Henrique Fontana havia sinalizado que poderia deixar o comitê caso o correligionário fosse mantido na coordenação do colegiado.
Incumbido de tentar administrar a divergência entre os dois parlamentares petistas, o líder do PT, José Guimarães, disse ao G1 nesta segunda, antes da reunião dos coordenadores da bancada, que a “tendência” é que Fontana e Vaccarezza sejam mantidos no grupo. “A tendência é manter os dois. Como é que o presidente da Casa diz isso e nós vamos dizer não”, ponderou José Guimarães.
O deputado cearense relatou ainda que a sigla montou uma espécie de “força-tarefa” para tentar convencer Fontana a atuar no colegiado mesmo sob a presidência de Vaccarezza.

domingo, 4 de agosto de 2013

Nepotismo e Capitanias Hereditárias na política brasileira

Jornal do BrasilLucas Altino *

A sucessão política entre parentes é prática comum no contexto brasileiro


O rumor de que o governador Sérgio Cabral renunciará ao cargo no início de 2014, abrindo espaços para a candidatura de seu filho, Marco Antônio Cabral, a deputado, ganhou mais força na última semana, após o presidente do PMDB, Jorge Picciani, confirmar a versão especulada na imprensa. Apesar de Cabral não assumir publicamente, a hipótese parece cada vez mais provável, ainda mais se considerando a queda vertiginosa da popularidade do atual governador. O apadrinhamento político, principalmente em casos de parentes, é uma das portas de entrada mais comuns nos bastidores políticos do Brasil. Assim, a renúncia de Cabral se explica pela “Lei da Inelegibilidade”, que impede a candidatura de cônjuges e parentes de presidente da república, governador de estado e prefeito,
Confirmada a continuidade política na linha hereditária, a família Cabral passa a se configurar como mais uma das muitas famílias que possuem presença marcante na política brasileira. Esta prática é tradicional na história do Brasil, recorrente desde os tempos das Capitanias Hereditárias. Marco Antônio, que, ainda possui em seu sobrenome o Neves de Tancredo, primeiro presidente eleito pós-ditadura, mas que faleceu antes de tomar posse, poderá representar a terceira geração de políticos dos Cabral.  O avô, Sérgio Cabral Santos, foi vereador do Rio de Janeiro entre 1983 e 1993, época em que o filho começou a ascender no cenário. Após participar da juventude do PMDB, Sérgio Cabral Filho assumiu a diretoria de Operações da Turisrio, no governo de Moreira Franco, e elegeu-se deputado estadual em 1990. Reeleito em 1994 e 1998, ele ainda foi senador até concorrer ao governo do Rio de Janeiro em 2006.
Ironicamente, o crescimento do atual governador entre cargos públicos do estado contou com a contribuição de outra família política do Rio de Janeiro, que, agora, é desafeta e opositora da base de governo do PMDB. Em 2006, quando foi eleito para o primeiro mandato do atual cargo que ocupa, Sérgio Cabral teve o apoio, no segundo turno, de Anthony e Rosinha Garotinho, os dois governadores antecessores.  A família Garotinho, que possui um curral eleitoral fortíssimo em Campos, cidade do interior do estado, conta com mais um sucessor na carreira política, a filha do casal e deputada estadual Clarissa Garotinho.
Tradição desde as Capitanias Hereditárias
A história da dominação de famílias políticas em cargos públicos, entre executivo, legislativo e judiciário, está na raiz da construção do Brasil, desde a época colonial.  Durante as Capitanias Hereditárias, sistema de administração territorial criado por D. João III, certos governantes tiveram seus sobrenomes prosseguindo na política brasileira por muitos anos. É o caso dos Albuquerque Maranhão, que teve em Afonso o primeiro da família a assumir um posto, quando foi presidente das províncias de Pernambuco e Paraíba até 1836, sucedendo-se por outros dez parentes, até Ney de Albuquerque Maranhão, o último da linhagem, que terminou seu último mandado, como senador, em 1995.
A distribuição de províncias a poucos grupos, durante as Capitanias Hereditárias, era prática muito comum. Somente a família Alencar, por exemplo, esteve à frente de três províncias, com Tristão Gonçalves no Ceará, sendo sucedido por José Martiniano e Tristão Araripe no Rio Grande do Sul e Pará. O domínio se estendeu até o período da ditadura militar, quando Humberto de Alencar Castello Branco assumiu a presidência do Brasil, após o golpe de estado em 1964.
A família que, durante a história do Brasil, se perpetuou no poder por mais tempo, passando por seis gerações, foi a Andrada. A partir de José Bonifácio, patriarca da independência, outros 22 Andradas figuraram no cenário político do país, com nomes atuantes até hoje. Como José Bonifácio Tamm, deputado federal de Minas Gerais, que mantém um mandato parlamentar há 56 anos ininterruptos, tornando-se em um dos parlamentares mais experimentados do mundo.  
Nordeste e Rio, currais eleitorais
Tradicionalmente o Nordeste, talvez por uma cultura coronelista, constitui-se como um polo de dominação patriarcal político. José Sarney e Antônio Magalhães são duas figuras que simbolizam esta prática, com seus sobrenomes presentes em cargos públicos até hoje. Sarney, que presidiu o Senado Federal até 2012, mantém um amplo curral eleitoral no Maranhão, eclodindo inclusive em casos de nepotismo, com a contratação de parentes para cargos de gabinete. Atualmente, seus filhos, José Sarney Filho e Roseana Sarney, ocupam a pasta do Ministério do Meio Ambiente e o governo do estado do Maranhão, respectivamente.
Já Antônio Carlos Magalhães, falecido em 2007, foi senador, ministro das Telecomunicações e Governador da Bahia. Seus dois filhos e mais um neto prosseguiram na política. Luís Eduardo Magalhães foi deputado federal e estadual pela Bahia, mas faleceu 1998. Atualmente, ACM Júnior é senador pela Bahia e ACM Neto é prefeito de Salvador. Outras três famílias também possuem muita força, hoje em dia, no Nordeste. O alagoano Renan Calheiros é o presidente do Senado Federal. Seu irmão, Olavo, foi deputado federal de Alagoas até 2011. Já Renildo, é prefeito de Olinda, em Pernambuco.
Da família Arraes, vieram dois governadores de Pernambuco, Miguel Arraes, até 1999, e Eduardo Campos, o atual mandatário. Já a famíla Alves é uma das mais influentes do Rio Grande do Norte. Agnelo Alves foi senador e prefeito por dois mandatos do município de Parnamirim ,até 2008. Seu filho, Carlos Eduardo, é o atual prefeito de Natal e seu sobrinho, Henrique Alves, é deputado federal e presidente da Câmara.
No Rio de Janeiro, muitas famílias políticas se perpetuam no poder até hoje. Além dos Cabral e Garotinho, os Bolssonaro, Picciani, Maia, Alencar e Brizola representam uma força eleitoral carioca. Jair Bolssonaro é uma das figuras mais polêmicas entre os políticos brasileiros. Deputado federal, ele ficou famoso por defender interesses militares e conservadores. Seus filhos, Flávio e Carlos, são, respectivamente, deputado estadual e vereador.
Jorge Picciani, ex deputado estadual e atual presidente do PMDB, abriu espaço para que seus filhos, Leonardo e Rafael, seguissem na política. Enquanto o primeiro está no seu terceiro mandato como deputado federal, o segundo ocupa o cargo de secretário de Estado de Habitação. Do lado da oposição, o deputado federal Rodrigo Maia segue os passos do pai, o ex prefeito e atual vereador Cesar Maia. Outro sucessor atuando na oposição é o deputado federal Brizola Neto, quem mantém a linhagem de seu avô, Leonel Brizola, ex-governador do Rio de Janeiro.
*Do Projeto de Estágio do Jornal do Brasil