quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Os marqueteiros da política na civilização do espetáculo

Diário da Manhã
Salatiel Soares Correia
A política de hoje, certamente, não é igual à de ontem. Os valores universais que fundamentavam a vida pública de fato empobreceram. Se ontem preponderavam, na cena política do País, personalidades do jaez de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Oswaldo Aranha ou Celso Furtado, todos homens de Estado com visão de mundo, nos dias de hoje, o que presenciamos é o predomínio da pequena política mais preocupada não com os destinos da nação, mas com sua própria sobrevivência nas próximas eleições.
Basta ver quem, hoje, comanda as grandes casas políticas desta nação continente e compará-los com quem anteriormente citei nestes escritos. A diferença de envergadura é enorme. O que levou Getúlio Vargas ao poder não foi a imagem, mas um importante processo político que se constituiu na vitoriosa Revolução de 1930. Fatores muito diferentes conduziram o ex-presidente Fernando Collor à presidência da República.  Nesta situação, predominou a imagem, a forma, enquanto que, na primeira, predominou o conteúdo, os princípios em torno de uma grande causa.
Se, antes, tínhamos um projeto de nação, este se perdeu por completo depois dos anos 1980. Se, antes, os princípios norteavam a vida política do país, o que, hoje, vemos preponderar é o culto à esperteza como reserva de valor. O aqui e agora vale mais que o legar um país melhor para a sociedade do futuro.
Vivenciamos aquilo que bem define o genial escritor peruano Mario Vargas Llosa, Nobel de literatura, como sendo a “civilização do espetáculo”. Uma civilização para a qual a forma vale mais que o conteúdo. Para Llosa, “na civilização do espetáculo, a política passou por uma banalização talvez tão pronunciada quanto a literatura, o cinema e as artes plásticas, o que significa que nela a publicidade e seus slogans, lugares-comuns, frivolidades, modas e manias ocupam quase inteiramente a atividade antes dedicada a razões, programas, ideias e doutrinas. O político de nossos dias, se quiser conservar a popularidade, será obrigado a dar atenção primordial ao gesto e à forma, que importam mais que valores, convicções e princípios”.
Veremos muito disso nas próximas eleições. Um personagem típico dessa civilização do espetáculo de que tanto nos fala o autor em seus escritos e aparece nos tempos de eleição: o marqueteiro. O marqueteiro constrói tudo que se refere à imagem de um candidato. Vende este como um produto. É exatamente aí que a forma se evidencia mais que o conteúdo.
Cabelos bem penteados, impostação da voz, promessas para a sociedade entrar no paraíso aqui mesmo na terra. Tudo meticulosamente estudado e planejado pelos marqueteiros para bem-vender o seu produto.
Muito diferentes eram aqueles tempos em que um Carlos Lacerda encantava pela oratória; de um Luís Carlos Prestes repleto de idealismo e causas revolucionárias; de Getúlio nos tempos da Segunda Guerra Mundial ou de um Juscelino Kubitschek e sua ânsia de acelerar o desenvolvimento do país de “cinquenta anos em cinco”. Em nível regional, diferente também de um Mauro Borges e seu famoso plano MB. No tocante ao estado do Tocantins, diferente daqueles tempos em que habitavam por lá o idealismo de um Souza Porto, de um João de Abreu ou até mesmo de um Teotônio Segurado. Homens que tinham uma causa e a ela dedicaram o seu viver. E assim o espetáculo faz da política de hoje uma fantasia. A forma reflete a falta de crença. É lamentável que seja assim.
(Salatiel Soares Correia, engenheiro, bacharel em Administração de Empresas, mestre em Planejamento, autor, entre outras obras, do livro A Construção de Goiás)

Coronelismo à francesa

“Coronelismo à francesa” leva milionário Serge Dassault a ser investigado
 
O senador e empresário Serge Dassault é investigado por compra de votos e lavagem de dinheiro
O senador e empresário Serge Dassault é investigado por compra de votos e lavagem de dinheiro
REUTERS/Charles Platiau
Gabriel Brust
Um senador da república milionário, octogenário e proprietário de meios de comunicação, governa durante anos uma região do interior usando práticas clientelistas e abusando da compra de votos nas regiões mais pobres para se perpetuar no poder. A descrição poderia tranquilamente ser aplicada a certos coronéis da política brasileira, não fosse pelo fato de que este senador começará hoje mesmo a responder na Justiça pelas acusações de corrupção.
Serge Dassault, o dono da quinta maior fortuna da França, será ouvido pela primeira vez pelos juízes de instrução de Paris sobre os supostos crimes de compra de votos e lavagem de dinheiro ocorridos entre 2008 e 2010. O período corresponde ao final da sua dinastia de 15 anos como prefeito da cidade de Corbeil-Essonnes, cerca de 30 quilômetros ao sudeste de Paris.
Dassault é, com frequência, descrito como o Cidadão Kane francês – uma referência ao magnata da imprensa americana William Hearst, eternizado no filme de Orson Welles. O seu grupo industrial atua nos mais diferentes mercados. O braço armamentista, por exemplo, fabrica os aviões Rafale, que a França tentou, sem sucesso, vender ao Brasil. Na mídia, Dassault possui o jornal conservador Le Figaro, um dos mais tradicionais da França.
A permanente proximidade com o poder impulsionou o crescimento da fortuna da família, segundo o especialista em crimes financeiros Thierry Colombié: "O Estado na França e todas as pessoas que podem ter uma posição dominante no Estado se aproveitam plenamente”, afirma Colombié. “É um caixa muito importante. Se você tem uma posição de senador ou deputado e ao mesmo tempo é um homem de negócios e ainda recebe subvenções para fabricar helicópteros, aviões e armas, você só pode ficar em uma posição dominante."
Tentativa de assassinato
Segundo as acusações, o milionário teria transformado a cidade de Corbeil-Essones em um feudo particular, controlando os bairros pobres através do suborno sistemático de líderes populares para vencer as eleições. Dessa forma, conseguiu transformar uma região tradicionalmente socialista em um bastião da direita francesa de 1995 até os dias atuais.
Os valores que circularam no esquema chegariam a 7 milhões de euros e parte desse dinheiro pode ser também a responsável por uma tentativa de assassinato – a cereja do bolo deste cenário de contornos mafiosos. Um dos braços direitos de Dassault, Younès Bounouara hoje está preso por ter dado um tiro em outro morador do bairro de Tarterêts. O cerne da disputa teria sido uma bolada de 2 milhões de euros que Bounouara recebeu de Dassault para distribuir na região. O milionário admite ter repassado a soma, mas nega que o dinheiro fosse destinado a suborno.
Para Thierry Colombié, o caso é inédito na política francesa de várias formas: "O que é ainda mais raro neste caso é que temos suspeitas de pagamento oculto, suspeitas de extorsão e tentativa de assassinato. Temos traficantes que são utilizados pelo sistema para comprar votos. O que é interessante nesse sistema de compras de voto é que não se trata simplesmente de se apropriar dos votos, mas principalmente restaurar um clima de paz social em bairros perigosos."
Quebra da imunidade parlamentar
As suspeitas sobre os supostos crimes começaram em 2009, a partir de depoimentos de moradores do mesmo bairro de Tarterêts, famoso por seu intenso tráfico de drogas. Dassault, hoje senador eleito pela mesma região, conseguiu se proteger das investigações graças à imunidade parlamentar. Tudo mudou na semana passada, quando o senado francês decidiu retirar a imunidade, após o terceiro pedido da Justiça. O próprio senador pediu a retirada, afirmando que poderá provar a sua inocência ao longo do processo. A questão é saber se ele terá forças para tanto.
Aos 89 anos, Dassault será interrogado em pleno hosptial Hotel-Dieu, devido a sua saúde fragilizada. Ele terá autorização da justiça para passar a noite em casa, mas deverá se reapresentar para novo interrogatório na manhã de quinta-feira (20).
O cientista político brasileiro Roberto Fragale, professor da Univesidade Federal Fluminense, ressalva que apesar das semelhanças aparentes, na essência o caso não se aproxima do coronelismo como o conhecemos no Brasil. A figura poderosa de Dassault no cenário nacional e até mesmo internacional o tornam uma figura única: “É um pouco mais complexo. A relação de Serge Dassault com o país é diferente. Temos uma inserção um pouco distinta. Embora tenhamos circunstâncias como a alegação de compra de votos, e é preciso cautela porque são até agora alegações,não temos necessariamente as mesmas conjunturas que possibilitem fazer essa associação entre coronelismo e esta denúncia.”

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Convulsões sociais e ideologia elitista

Por Francisco Fernandes Ladeira em 18/02/2014 na edição 786
Na recente história do Brasil, poucos anos tiveram um início tão conturbado quanto o atual. Mesmo levando em consideração que 2014, por ser o ano da segunda Copa do Mundo em nosso país e de eleições presidenciais, começou repleto de expectativas, é fato que poucos analistas imaginavam que os meses de janeiro e fevereiro seriam marcados por tantas convulsões sociais. Conforme a experiência nos tem mostrado, em tempos de acirramento de conflitos entre classes, a ideologia elitista da grande mídia tupiniquim, muitas vezes escamoteada pela hipocrisia cotidiana, tende a aflorar com maior intensidade.
Entre os exemplos recentes que corroboram as ideias expostas acima, podemos citar as tendenciosas coberturas dos “rolezinhos” (eventos convocados pelas redes sociais em que jovens da periferia combinam passeios em shopping-centres), da passeata do MST em Brasília e sobre a repercussão de uma foto divulgada no Facebook em que um jovem negro está acorrentado a um poste. Em todos os acontecimentos citados, salvo raras exceções, é fácil constatar que a atuação dos grandes meios de comunicação teve a clara intenção de manipular a realidade e, por outro lado, direcionar a opinião pública para um posicionamento contrário aos setores mais vulneráveis de nossa sociedade.
Segundo o Jornal da Band, os chamados “rolezinhos” são “invasões de jovens, em que os participantes dizem que o objetivo é apenas diversão, mas os encontros apavoram os lojistas e clientes, e frequentemente há registros de furtos e vandalismos”. Para Rachel Sheherazade, âncora do SBT Brasil, os membros dos “rolezinhos” são arruaceiros que se reúnem em locais privados e “tocam” o terror. “Será que só vamos tomar uma providência [contra os “rolezinhos”] quando os arrastões migrarem das periferias para os shoppings de luxo?”, questionou a jornalista, em uma nítida tentativa de criminalizar a população periférica.
Alógica racista
Em suma, a mensagem das classes dominantes é patente: negros e pobres só são socialmente aceitos quando ocupam posições subalternas ou os espaços periféricos a eles destinados; sua presença nos templos do consumismo moderno, os shoppings centers, não deve ser, em hipótese alguma, tolerada.
Em relação à manifestação do MST na capital federal, que acabou em confronto entre os integrantes do movimento e policiais, os “especialistas” da mídia hegemônica mais uma vez despejaram todo o seu ódio àqueles que militam pelas causas sociais. Os noticiários da Rede Globo, por exemplo, foram marcados por várias imagens que apresentavam as “ações violentas” dos manifestantes. Sobre as causas do início do conflito, os grandes veículos privilegiaram a versão dos policias em detrimento dos argumentos dos trabalhadores rurais sem-terra. De acordo com Reinaldo Azevedo, os membros do MST promovem uma “guerra vermelha” e são responsáveis por “invasões de propriedades privadas no campo, o que afronta o estado de direito”. Entretanto, o articulista da Veja não menciona em seus artigos as denúncias de grilagens, assassinatos e utilização de trabalho escravo que são direcionadas contra os grandes latifundiários brasileiros.
Por fim, a imagem do adolescente negro acorrentado por “justiceiros” a um poste em um bairro nobre do Rio de Janeiro (uma prática que nos remete aos antigos pelourinhos) recebeu grande destaque na mídia hegemônica e também demonstrou a lógica racista que norteia as relações sociais em nosso país.
Em artigo publicado no Diário do Comércio, o filósofo Olavo de Carvalho chamou o jovem de “bandidinho estapeado” e “delinquentezinho”. “Num país que sofre de violência endêmica a atitude dos ‘vingadores’ é até compreensível. O Estado é omisso, a polícia desmoralizada, a Justiça é falha. O quê que resta ao cidadão de bem que ainda por cima foi desarmado? Se defender, é claro! O contra-ataque aos bandidos é o que eu chamo de legítima defesa coletiva [...]. E aos defensores dos direitos humanos que se apiedaram do marginalzinho preso ao poste, eu lanço uma campanha: faça um favor ao Brasil, adote um bandido”, asseverou RachelSheherazade no SBT Brasil.
Coronelismo midiático
Já uma matéria da revista Veja destacou os delitos cometidos pelo jovem que foi amarrado ao poste. Porém, as longas fichas criminais dos “justiceiros” – que incluem acusações de estupro, lesão corporal e furto – não foram mencionadas pela publicação da família Civita e tampouco pelos seus congêneres midiáticos.
Diante dessa realidade cabe aqui uma pergunta capciosa: será que RachelSheherazade lançaria a campanha “adote um justiceiro”? Não por acaso o sindicato dos Jornalistas Profissionais do município Rio de Janeiro divulgou uma nota de repúdio à âncora do SBT por apologia à violência.
Ora, se todos os cidadãos se julgarem no direito de fazer justiça com as próprias mãos certamente retrocederíamos à barbárie. Ademais, lembrando o pensamento de Thomas Hobbes, o advento da civilização só foi possível quando os seres humanos renunciaram ao seu direito natural à violência e transferiram a prerrogativa de julgar a uma instância superior: o Estado com suas instituições.
Não bastasse toda essa atual cruzada conservadora, um evento marcado para o próximo mês pretende reeditar a perniciosa “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” como parte das “comemorações” pelos 50 anos do golpe militar.
Enfim, diante desses fatos, torna-se necessário questionar o porquê de a grande mídia brasileira geralmente apresentar uma visão unidimensional da realidade. Somente determinado ponto de vista tem espaço nas maiores emissoras de televisão e nos principais jornais e revistas do país. Opiniões divergentes ao status quosão propositalmente ignoradas.
Desse modo, é preciso democratizar os meios de comunicação para que os diferentes setores sociais possam ter a oportunidade de defender os seus valores políticos. Em última instância, uma verdadeira democracia passa, impreterivelmente, pelo fim do coronelismo midiático.
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Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas: Brasil, Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de Geografia em Barbacena, MG

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Demagogos em busca de otários

Publicado por  * Luiz Flávio Gomes
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O Brasil se destaca mundialmente também por algumas políticas públicas erradas. O que vem sendo feito no campo da criminalidade, da violência e da segurança pública constitui um exemplo emblemático disso. Está praticamente tudo errado! Há pelo menos 7 décadas estamos sob o império do chamado populismo punitivo midiático-vingativo, que nunca diminuiu nenhum tipo de crime no nosso país, sendo mais inócuo e estéril que um monge virtuoso. Uma podre, retrógrada e extrativista elite, composta, sobretudo, de parlamentares oportunistas e corruptos (para 81% dos brasileiros os políticos são corruptos ou muito corruptos – Ibope), é a grande responsável pela política da aprovação reiterada de novas leis penais, sempre mais severas, com a promessa de que com elas resolverão o problema da segurança. Pura enganação! Com uma nova lei dizem que vão acabar com a violência nos protestos populares. Sobram leis no Brasil. Falta o cumprimento delas.
Nos países de capitalismo evoluído e distributivo, fundado na educação de qualidade para todos (Dinamarca, Holanda, Finlândia, Coreia do Sul, Japão etc.), é o racionalismo legislativo que combate o irracionalismo midiático e popular. Nos países atrasados, de capitalismo selvagem e extrativista (como o Brasil), é o legislador, como agente político dessa elite atrasada, que, por conveniência eleitoral, atua irracionalmente (emergencialmente, emocionadamente, desproporcionalmente e populistamente).
Essa fórmula charlatã só tem sucesso em democracias de massas, que exigem a atuação de um demagogo (porque a democracia de massas e a demagogia formam um só par, como diz M. Weber, citado por Luís Wanderley Gazoto, no nosso livro conjunto Populismo penal legislativo, no prelo). Nelas os demagogos nos retiram a qualidade de cidadãos pensantes (manda o ignorantismo). Somos meros números e consumidores teleguiados. O demagogo só existe, no entanto, quando alguém acredita nele. Não existe demagogo sem o otário. Os padres demagogos (Krämer e Sprenger) que cristalizaram a histérica caça às bruxas, no século XV, só fizeram sucesso com o Martelo das feiticeiras porque havia otários que acreditavam em bruxas. Hitler só fez sucesso com seu nazismo, trucidando milhões de pessoas, porque muitos otários acreditavam na purificação da raça ariana. É assim que caminha, também por aqui, a marcha da insensatez coletiva.
É hora de abandonarmos a condição de otários (que querem nos impor) e rompermos nossa herança maldita do colonialismo teocrático extrativista, que aqui implantou a cultura do autoritarismo, dos saques, da pilhagem, da roubalheira, do sangue, da violência, do enriquecimento sem causa, do parasitismo escravizador, da ignorância, da malandragem e do segregacionismo étnico, racial e socioeconômico. É hora de nos emanciparmos, como dizia Kant no século XVIII. Ou continuaremos contabilizando “cadáveres antecipados”.



*Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz...

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Os chefes políticos municipais

Se os coronéis não existem mais, ainda predominam nos municípios goianos os chefes políticos que, ao longo dos anos, se elegem prefeitos, fazem os sucessores e nomeiam os protegidos para os cargos nas prefeituras

Diário da Manhã - Helton Lenine
 
A exemplo do que ocorria no passado, desde a República Velha quando os coronéis mandavam na política municipal e estadual, ainda hoje predominam os chamados chefes políticos. No Brasil e em Goiás, eles estão esparramados pelos rincões afora.
Nos 246 municípios goianos, são raras as localidades onde não existem os chefes políticos, os que dominam os partidos, escolhem os candidatos e fazem predominar suas vontades. É uma tradição da política que se arrasta por décadas.
Os chefes políticos se elegem para os cargos de prefeito, elegem os sucessores, ajudam na campanha de candidatos a vereador e ainda interferem na nomeação de amigos, parentes e aliados a cargos comissionados nas prefeituras.
Há municípios em que os prefeitos foram os mesmos por 20 anos e em outros os chefes políticos elegeram os sucessores, que, normalmente, foram familiares.
Nas eleições de 2012, segundo dados da Associação Goiana de Municípios, mais da metade das cidades o prefeito conseguiu se reeleger ou elegeu o sucessor.
Na prática, o que se verifica é a vontade do chefe político prevalecendo, apesar da existência de lei que impossibilita mais de dois mandatos consecutivos. Há casos em Goiás de políticos que tiveram cinco mandatos de prefeito ou de vereador.
Em consequência da desobediência às leis eleitorais é que houve mudança de titularidade por cassação ou renúncia, realizando-se as eleições suplementares em várias cidades, em diversos pleitos.
Há exemplos de prefeitos que, concluídos os mandatos em suas cidades, transferiram o domicílio eleitoral para localidades próximas e renovaram o mandato em outro município, burlando a legislação eleitoral.
O caciquismo é oriundo da época do Império, mas o método era utilizado por poucos líderes políticos até ser redescoberto na República Velha e se perpetuado após a Revolução de 30, chegando aos dias atuais.
Uma vez que o fenômeno é bastante semelhante ao coronelismo e ao caudilhismo, o caciquismo difere na agressividade.
O cacique político é o chefe político local de uma determinada comunidade, pode ser um deputado estadual, federal ou um senador. Seu domínio se espalha pelos currais eleitorais que estão a seu dispor. O traço principal do coronel-cacique é a chamada política clientelista, esta se dá através de concessão de favores e cargos públicos, chamados de cargos de confiança, ou cargos comissionados.
O caciquismo também se utiliza da chamada política de mão no ombro. Normalmente o cacique domina seu eleitorado da mesma forma que o caudilho, isto é, pela emoção, mas detém o poder de controlar a quantidade de votos de determinada região da mesma forma que o coronelismo, só que desta vez o controle é por zona eleitoral, e não por área rural. Desta forma, o cacique age cortando as verbas e trabalhos da máquina estatal para esta zona eleitoral, propiciando um enriquecimento ou empobrecimento da região conforme sua necessidade de angariar poder. Igual ao coronel, o cacique age também sobre o processo eleitoral local, o que multiplica seu poder e o torna temido.
Quem é quem
pelo estado
afora
Goiânia, com mais de um milhão de habitantes, é exceção, pois não há predomínio de um chefe político. O comando da prefeitura, ao longo dos anos, se pulverizou. Apenas Iris Rezende se impôs na Capital, mesmo assim pelo voto popular. Foi eleito prefeito de Goiânia por três mandatos e vereador uma vez. Se há um chefe político na Capital, ele se chama Iris Rezende. O líder do PMDB contribuiu com a eleição de seu sucesso, o prefeito Paulo Garcia. Nion Albernaz foi prefeito nomeado uma vez e eleito pelo povo por duas vezes. Nion exerceu forte influência na política de Capital, contribuindo com a vitória de candidatos a vereador, deputado estadual e federal. Agora, acaba de ajudar na eleição do neto, Thiago Albernaz, a vereador.
Em Anápolis, não há um chefe político na história recente. Os irmãos Santillo – Henrique, Adhemar e Romualdo – dominaram a política anapolina desde a década de 70. Henrique Santillo, médico, foi vereador, prefeito, deputado estadual, senador, governador. Adhemar foi deputado estadual, deputado federal e prefeito por três mandatos. Romualdo uma vez deputado estadual. Onaide, mulher de Adhemar, deputada estadual por três vezes. Os irmãos Santillo influenciaram, com o prestígio, a eleição de diversos companheiros para a Câmara de Vereadores. O médico Anapolino de Faria também teve seu período de chefe político: foi deputado estadual, deputado federal e prefeito por três vezes. Anapolino elegeu também seus aliados a vereador. Os irmãos Rubens e Antônio Gomide podem ser considerados os chefes políticos atuais de Anápolis. Rubens é deputado federal pelos segundo mandato e Gomide prefeito reeleito, depois de ter sido vereador.
Em Rio Verde, o médico Juraci Martins, prefeito reeleito, dá as cartas, numa cidade onde já teve chefes políticos como Paulo Roberto Cunha, Osório Santa Cruz, Eurico Veloso.
Em Jataí, o político mais influente é Maguito Vilela, que foi governador e hoje exerce o cargo de prefeito de Aparecida de Goiânia. O engenheiro civil Humberto Machado, que exerce o quarto mandato à frente da Prefeitura de Jataí, foi lançado por Maguito, a exemplo dos ex-prefeitos Nelson Antônio e Fernando Peres. Deputado federal Leandro Vilela é sobrinho e o deputado estadual Daniel Vilela filho de Maguito.
Em Aparecida de Goiânia, Maguito Vilela dá as cartas, depois de ser reeleito prefeito da cidade. Ademir Menezes, que foi prefeito duas vezes, ajudou na eleição de José Macedo para a prefeitura, ocupa mandato de deputado estadual. Seu filho, Mas Menezes, foi vereador. Outro expoente da política da cidade foi Norberto Teixeira, prefeito, deputado estadual e deputado federal.
Em Mineiros, o advogado Agenor Rezende, que já foi vereador, deputado estadual, governador, é o prefeito da cidade. Aderaldo Barcelos é outro político influente. Foi prefeito por dois mandatos e elegeu sua esposa, Neiba Barcelos, também por duas vezes. A cidade já teve um líder político influente, na década de 1970: José Alves de Assis, vice-prefeito, deputado estadual e deputado federal.
Em Itumbiara, o maior liderança política é o ex-prefeito José Gomes da Rocha, que ocupou o cargo por duas vezes e elegeu o seu sucessor: Francisco Faria, o Chico Balla. Alcides Rodrigues e Marconi Perillo tiveram votações expressivas em Itumbiara, na disputa para o governo, graças à presença de José Gomes em seus palanques. A cidade já teve chefes políticos importantes como Modesto de Carvalho, Radivair Miranda e Waterloo Araújo.
Em Catalão, o agropecuarista Haley Margon Vaz foi prefeito e exerceu forte liderança política. O médico Adib Elias foi prefeito por dois mandatos, elegeu o sucessor, Velomar Rios e sua mulher, Adriete, deputada estadual. O também médico Jardel Sebba, prefeito, foi deputado estadual por dois mandatos.
Em Ipameri, o médico Rubens Cosac foi prefeito, deputado estadual, deputado federal e elegeu a mulher, Lamis Cosac, prefeita e deputada estadual.
Em Goianésia, o chefe político sempre foi o ex-governador Otávio Lage, que elegeu os filhos – Otávio Lage Filho e Jallles Fontoura – prefeitos da cidade. Jalles foi deputado estadual e federal. Em diversos mandatos, Otávio elegeu aliados prefeitos da cidade. O advogado Gilberto Naves também exerce forte influência na política da cidade, pois foi prefeito por duas vezes, e elegeu sua mulher, Mara Naves, prefeita e deputada estadual.
Em Ceres, o médico Valter Melo foi prefeito três vezes e elegeu sua mulher, Wanda Melo, deputada estadual. O também médico Carlos Mendes foi prefeito, deputado estadual e estadual. Tanto Valter quanto Carlos elegeram diversos aliados prefeito e vereador na cidade.
Em Jaraguá, o empresário Francisco de Castro comandou vitórias de diversos companheiros à prefeitura e à Câmara de Vereadores. Alano de Freitas, seu primo, foi prefeito. O advogado Nelson de Castro foi deputado estadual e atuou com força na política local. Lineu Olímpio foi prefeito por duas vezes e elegeu o sucessor, Ival Avelar.
Em Luziânia, o lendário Joaquim Roriz (de tantos mandatos em Goiás e no Distrito federal) já teve parentes, amigos e aliados políticos ocupando cargos na prefeitura ou na Câmara, por sua interferência. O médico Célio Silveira foi prefeito por dois mandatos. O prefeito Cristovão Turmin (já foi deputado estadual) inicia seu período de líder político local.
Em Formosa, José Saad foi prefeito por três vezes, eleito pelo povo. Sebastião Monteiro, o Sebastião Caroço (hoje conselheiro do TCM) foi prefeito duas vezes, elegeu o sucessor, Pedro Ivo Faria e tantos vereadores da cidade. O prefeito Itamar Barreto inicia o seu período de líder político local.
Em Trindade, Valdivino Chaves foi prefeito por três vezes e ajudou a eleger diversos companheiros. O médico George Morais foi prefeito da cidade por duas vezes e ajudou na eleição da esposa, Flávia Morais, a deputada federal. George foi prefeito também de Santa Bárbara. O empresário Jânio Darrot, depois de exercer mandato de deputado estadual, ocupa a prefeitura da cidade.
Em Inhumas, Irondes José de Morais e José Essado, prefeitos da cidade, foram chefes políticos. Essado é suplente de deputado estadual. O deputado federal Roberto Balestra (cinco mandatos) não se elegeu prefeito, mas contribuiu com a vitória de vários companheiros, entre eles Abelardo Vaz Filho. O prefeito Dioji Ikeda inicia o seu período de líder local.
Em Morrinhos, Napthali Alves de Sousa, Helenês Cândido e Joaquim Guilherme Barbosa, quando ocuparam a prefeitura, foram líderes políticos locais. O prefeito Rogério Troncoso, já em seu terceiro mandato, também é influente chefe político da cidade.
Em São Luiz de Montes Belos, Waldemir Xerife reinou absoluto: foi prefeito duas vezes e elegeu sua esposa, Marisa Guimarães, também prefeita por duas vezes.
Em Porangatu, o empresário Júlio da Retífica foi prefeito, elegeu o sucessor, José Oswaldo, e exerce mandato de deputado estadual. Eronildo Valadares, atual prefeito, elegeu sua esposa, Vanusa Valadares, deputada estadual.
Em Simolândia e Alvorada do Norte, no Nordeste do Estado. o empresário e hoje deputado estadual Iso Moreira exerce, há décadas, forte influência. Isso foi prefeito de Simolândia, elegeu sua esposa, Deusdet Ferreira também prefeita, e o filho, Alessandro Moreira, prefeito de Alvorada do Norte, além de sucessores nas duas cidades. Nos demais municípios da região, Iso Moreira ajudou a arrumar votos para os aliados chegarem às prefeituras e câmaras municipais.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

VONTADE POLÍTICA É A VERDADEIRA SECA DO NORDESTE


 João Suassuna - Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco

As áreas sedimentares que possibilitam a acumulação de água no subsolo são muito esparsas na região Nordeste

 
Já é mais do que sabido que as secas do Nordeste são periódicas e, enquanto fenômeno natural, não há como combatê-las. Todavia, os seus efeitos podem ser enfrentados com tecnologias apropriadas, tornando possível a convivência do homem com o meio árido.
Quando tratamos de tecnologias agrícolas para o Semi-árido - entendidas aqui como aquelas fixadoras do homem no campo - temos que ter em mente um ponto que é fundamental: a exploração, e com muita competência, da capacidade de suporte da região. Neste aspecto somos otimistas.
O Nordeste brasileiro tem 1600 000 Km² e apenas 2% dessa área são passíveis de irrigação. Apesar de restrita, devido a problemas de qualidade de solos, bem como de quantidade e qualidade de água, a região poderá vir a ser um dos maiores pólos de fruticultura do mundo. Estima-se o potencial irrigado do Vale do Rio São Francisco em aproximadamente 1 milhão de hectares. Como termo de comparação, o Chile, país com clima temperado, produziu no ano de 1997, em aproximadamente 200 mil hectares irrigados, algo em torno de 1,5 bilhão de dólares em frutas. Temos, seguramente, nas margens do São Francisco, a capacidade de produzir cinco vezes mais do que o Chile, com uma vantagem adicional: o nosso semi-árido é o único no mundo localizado em uma região tropical, significando dizer que não temos a ocorrência de neve nos invernos. Este aspecto, aliado a intensa insolação - o semi-árido tem aproximadamente 3000 horas de sol por ano - e com técnicas avançadas de irrigação, possibilita até 3 colheitas por ano. A uva é um bom exemplo de produção nas margens do São Francisco.
Fala-se muito no extenso lençol de água no subsolo do Nordeste, e que sua exploração poderia ser a solução para resolver de vez os problemas hídricos da região. Não é bem assim. Nesse aspecto, temos que ter um pouco de cautela. Água de subsolo só existe quando a geologia assim o permite. As áreas sedimentares que possibilitam a acumulação de água no subsolo são muito esparsas na região. No Semi-árido, o Estado do Piauí é o que apresenta um maior percentual de áreas sedimentares (praticamente todo o estado) e tem demonstrado exemplos de fartura hídrica, a exemplo dos poços jorrantes no município de Cristino Castro. Quando houver possibilidade de exploração das águas destas áreas no Semi-árido, vamos assim fazê-lo. O que não se pode é extrapolar o exemplo do Piauí para o Nordeste como um todo. Nos demais estados, as áreas sedimentares são por demais esparsas não justificando aquela premissa inicial de exploração intensa das águas do subsolo. Para se ter uma idéia do problema, 70% do semi-árido encontram-se sobre um embasamento cristalino, no qual as únicas possibilidades de acesso a água ocorrem através de fraturas nas rochas cristalinas e nos aluviões próximos a rios e riachos. Em geral, essas águas são poucas e extremamente salinas.
Paralelamente à questão da água do subsolo da região fala-se muito, nos dias de hoje, na polêmica transposição das águas do Rio São Francisco como alternativa redentora para mitigar a sede dos nordestinos. Esta questão precisa ser tratada com cuidado. As prioridades iniciais do Rio São Francisco foram para gerar energia elétrica e irrigar. Isto deveria ser encarado como uma questão de segurança nacional. O rio, por ter o seu curso no Semi-árido inteiramente sobre regiões cristalinas, apresenta, como de regra, afluentes com caráter temporário. Esse aspecto traz, como conseqüência, uma redução de sua vazão no período de estiagem. Para solucionar este problema, a Companhia Hidrelétrica do São Francisco - CHESF construiu a represa de Sobradinho para manter a vazão do rio em patamares adequados à geração de energia elétrica no complexo de Paulo Afonso. Sabemos, no entanto, que Sobradinho tem operado em regimes críticos - em janeiro de 1998 apresentava apenas 13% de sua capacidade de acumulação - voltando à tona as ruínas das cidades que foram submersas com o represamento de suas águas, significando dizer que o rio praticamente havia voltado ao leito normal como antes de ser represado. Somado a esse problema da vazão, é importante esclarecer que o uso da água do São Francisco na irrigação é consuntivo, ou seja, a água não retorna ao rio após ser levada até as culturas. Nesse quadro de penúria hídrica, querer-se subtrair mais água do rio para abastecimento das populações é, na melhor das hipóteses, uma ação inconseqüente. Certamente não teremos água para atender a tudo isso (geração, irrigação e abastecimento). Ação muito mais coerente, quanto a este aspecto, seria a de se propiciar um melhor gerenciamento no uso das águas das grandes represas do Nordeste. Orós, no Estado do Ceará, por exemplo, que possui 2 bilhões de m³ de água, até hoje não justificou o porquê da sua construção. As águas estão lá evaporando e não se conhece um projeto de envergadura que justifique a sua condição de maior represa do Ceará. O Estado da Paraíba saiu na frente na campanha de um bom gerenciamento das águas de represas. Está para ser concluído o canal Redenção que irá transportar as águas dos açudes Coremas/Mãe D’água para irrigação nas várzeas de Souza. A represa Ribeiro Gonçalves, no Rio Grande do Norte, que chega a ser até um pouco maior que Orós (possui 2,2 bilhões de m³) está irrigando os municípios de Açu e Ipanguaçu e têm surgido vários pólos interessantes de fruticultura na região. O bom uso das águas das represas, ao nosso modo de entender, seria uma alternativa mais coerente na atual conjuntura em detrimento da alternativa de transposição das águas do São Francisco.
Outro aspecto importante e merecedor de atenção como alternativa produtiva no Semi-árido é o setor extrativista vegetal. Temos no Semi-árido uma riqueza enorme de plantas adaptadas ao ambiente seco que poderiam ser economicamente exploradas. Citamos alguns exemplos: como produtoras de óleos, Catolé, Faveleira, Marmeleiro e Oiticica; de látex, Pinhão, Maniçoba; de ceras, Carnaúba; de fibras, Bromeliaceas; medicinais, Babosa, Juazeiro; frutíferas, Imbuzeiro e as forrageiras de um modo geral. Temos um número de plantas enorme e praticamente não se conhece nada sobre elas. Ações de governo, nesse sentido, seriam importantíssimas.
A pecuária talvez seja a mais importante das alternativas para a região seca, principalmente por se tratar de uma região carente em proteína. Ações realizadas com sucesso no Carirí paraibano, especificamente no Município de Taperoá, têm demonstrado que o cultivo da palma e a fenação de forrageiras resistentes à seca como é o caso do capim buffel e do urocloa, aliados a criação de um gado igualmente resistente e de dupla aptidão (carne e laticínios) a exemplo do Guzerá e do Sindi oriundos dos desertos da Índia e de pequenos ruminantes melhorados geneticamente (caprinos e ovinos), têm possibilitado a sobrevivência digna do homem na região. A piscicultura é outra alternativa que poderá ser desenvolvida através da utilização do potencial de açudes já instalado. Ações governamentais que dêem suporte aos produtores, sejam eles pequenos ou grandes, principalmente no setor creditício, são importantes e oportunas.
No que diz respeito à produção de grãos, entendemos que esta prática deveria ser banida dos limites do Polígono das Secas. A instabilidade climática da região é severa e torna a produção de grãos uma verdadeira loteria. Não podemos expor o homem nordestino a situações vexatórias. Estudos da EMBRAPA atestam que as colheitas seguras, nos limites do Semi-árido, ocorrem em apenas 20% dos casos. Em 10 anos agrícolas, apenas 2 apresentam colheitas com sucesso. Este percentual é muito baixo se levarmos em consideração que a fome dos animais, aí incluído o homem, ocorre em 100% dos casos. Um animal que não se alimenta hoje, inexoravelmente amanhã estará com fome. Atualmente, basta a ocorrência de uma única chuva para levar os governos estaduais a abarrotarem o Semi-árido com sementes selecionadas, e acharem que esta prática é sinônimo de boa administração. O que ocorre, na maioria das vezes, é que outras chuvas demoram a ocorrer e todo o trabalho do nordestino no preparo do solo e plantio é desperdiçado, e o que é pior, ele normalmente não dispõe de outra alternativa que lhe garanta o sustento e a vida. Muitas vezes termina por se alimentar de palma - alimento que é fornecido aos animais - como única opção de alimento disponível, como se verificou recentemente aquí em Pernambuco. Como produzir grãos numa região com problemas climáticos tão sérios, se podemos produzir, e com competência, a proteína animal em termos de carne, leite e peixes e, a partir desses produtos, adquirir os grãos necessários à alimentação, produzidos em outras localidades do país, com condições mais propícias para assim fazê-lo ? É uma questão de se adequar uma política agrícola, que efetivamente não temos, à uma realidade regional. Neste aspecto somos pessimistas.
Entendemos que os políticos, isso em regra geral, costumam fazer política com o sofrimento e a miséria do povo. As alternativas de produção existem e não são implementadas porque, na verdade, tem faltado aos administradores públicos a indispensável vontade política para definir ações estruturadoras no semi-árido. E tem faltado porque concretizá-la significa contrariar interesses, muitas vezes situados na base de apoio parlamentar do governo. É exatamente aí onde está a nossa verdadeira seca.

Texto publicado na GAZETA DO NORDESTE do dia 19 de maio de 1998