Por: Gercinaldo Moura
O principio mais razoável
para a existência do Estado é, ou pelo menos deveria ser a representação dos
interesses do seu povo, mas a realidade nos revela um Estado, ao longo de nossa
História, representativo dos interesses básicos das classes dominantes, onde na
maior parte desta História, os direitos concedidos aos cidadãos são regulados
de acordo com suas posses, sendo o Estado um organismo de proteção aos que
possuem contra os que nada possuem, ou nas palavras de Rosseau: “controlados
pelos maus governos, o sistema jurídico do Estado somente serve para manter o
pobre na sua miséria e o rico na sua usurpação. Na realidade as Leis são sempre
úteis aos que muito possuem e prejudicam aos que nada tem”.
É possível perceber
explicitamente esta face escandalosamente brutal do governo nas negociações com
as administradoras dos planos de saúde, que visam uma subordinação da saúde ao mercado
como simples produto.
Esse mundo de monopólios, no qual o lucro tem primazia sobre a
vida não é o mundo possível pelo qual a sociedade civil objetiva. A saúde deve
ser reconhecida como direito universal e fundamental e as políticas públicas
precisam ser elaboradas para promover acesso a ela, com qualidade e democracia.
Afirmar
esse aspecto como um direito humano, discutir políticas públicas para essa área
deve ser visto não como virtude de um governo, mas como uma obrigação do estado
e um direito do ser humano.
A compreensão de que a saúde é um serviço que
pode ser prestado pelo mercado é considerado o maior perigo das atuais reformas
dos sistemas de saúde.
O cenário
acima descrito aponta para o retrocesso dos tímidos avanços nas negociações que
visam o equilíbrio entre comércio e saúde, entre os países da OMC, que
culminaram com a Declaração de Doha em 2001, sobre a saúde pública e acesso a
medicamentos, estabelecendo a saúde pública como primazia sobre os interesses
comerciais.
É lastimável a placidez da
nossa postura diante da prepóstera intervenção do governo no mercenarismo
ilícito das operadoras de plano de saúde, porque mesmo quem paga não tem
certeza do direito atendido precisamente pelos planos de saúde.
Portanto, aquele que
deveria deferir uma política de saneamento das necessidades do povo vem construindo uma agenda de luta em favor da privatização da
saúde, nos tornados em expectadores de uma política de legitimação da
saúde pública como um mero produto de mercado.
O Governo “não tem dinheiro” para
aplicar no sistema público de saúde mas beneficia empresas operadoras
de planos com diversas isenções fiscais, sem o ressarcimento previsto
em Lei, e ainda paga planos de saúde para o funcionalismo público. Apesar do governo não
investir o suficiente no SUS para que ele cumpra seus propósitos, significativas
somas de recursos públicos são aplicadas – direta ou indiretamente – nas
administradoras de planos de saúde, o que significa uma apropriação indébita do
público pelo privado.
Em
vez de estar discutindo e promovendo os interesses econômicos insaciáveis
destes mercenários, em detrimento de uma solução para o deficiente estado da
saúde pública, deveria o governo voltar-se para discutir
alternativas concretas ao modelo neoliberal proposto pelos acordos de livre
comércio - que tratam a saúde como mercadoria - e assumir sua obrigação
revertendo nossos impostos para a saúde como um bem público, de modo que garanta um sistema de saúde público com médicos,
medicamentos e equipamentos.
Mas as condições médicas do dia a dia evidenciam, claramente, a
falta de decisão política por parte do governo, que tem a obrigação, embora não
cumprida, de contribuir para um melhor acesso de todas as pessoas aos
medicamentos que podem, inclusive, salvar suas vidas.
Com verdadeira vontade política, o governo poderia contribuir
significativamente para que a saúde pública alcançasse uma boa qualidade. Soluções criativas e
radicais deveriam ser criadas em todos os níveis de poder, para assegurar saúde
de interesse público e a dignidade humana.
Dessa maneira, certamente
ele (o governo), não precisaria preocupar-se em, supostamente, controlar a fome
monetária destas rapinas, pois o próprio governo seria o parâmetro para o setor
privado de saúde, se é que haveria necessidade de alguém recorrer a ele (setor
privado) com um atendimento de saúde publica equivalente a honra dos tributos
dos cidadãos.
Gercinaldo moura é Professor da UFAL, tem artigos
publicados em
Revistas Cientificas e Sites Especializados. E-mail: gercinaldomoura@yahoo.com.br