segunda-feira, 31 de março de 2014

Política de filhotes

Por Wilson Nogueira
 
Daqui a pouco, em outubro, vamos às urnas novamente. Muito melhor assim, mas não devemos tomar a eleição – ou ao menos qualquer eleição – como sinônimo absoluto de democracia. Ainda precisamos superar as contradições que se aprofundaram e se aprofundam no processo eleitoral brasileiro pós-ditadura militar, entre as quais, a ideia de que esses partidos conservadores e neoconservadores representam, necessariamente, as vontades convergentes e divergentes das sociedades, das comunidades, das cidades, dos lugares etc.
A democracia, como conceito ou prática, não se encerra na partidarização das ideias e/ou na particularização das práticas, embora elas sejam parte importante e necessária à agitação das contradições sociais presentes e ao surgimento dos novos momentos. Não se trata, aqui, da negação da política partidária, mas da sua reelaboração ou refundação nos termos da soberania popular. O que ocorre, hoje, no Brasil, no geral, é que a política partidária nega a própria política como civilidade, polidez e delicadeza e, assim, se transforma em astúcia, grosseria e indelicadeza. O Brasil precisa de partidos políticos, sim, mas daqueles que vierem respeitar povo como soberano de suas vontades, desejos e aspirações. Novos partidos, porém, dependem de uma nova política que gere novos políticos. O problema, então, passa a ser este: como gerar o novo a partir do velho? Inexiste uma resposta acabada, mas, talvez, não haja outro lugar para encontrá-la a não ser nas incertezas das vivências cotidianas. Aliás, a esse respeito só haveria mesmo uma certeza: a de que a política brasileira precisa se reinventar e que essa reinvenção não será suscitada nem realizada por espontânea vontade dos partidos e dos políticos.
As mudanças dependem, prioritariamente, das articulações das sociedades na busca da manifestação de origem da democracia como “vontade soberana do povo”. Isso implica no afastamento dos sistemas oligárquicos, dos conglomerados econômicos, das confissões religiosas, dos latifundiários, dos coronéis de barranco etc. do domínio dos destinos do país. Esses grupos se adonaram da soberania da pátria, por meio do controle das suas instituições representativas, desde os primeiros passos da redemocratização do país, conquistada com sangue e suor do povo. Numa democracia plena, todas as forças sociais são representadas sem sobreposições de poder.
No Brasil, essas forças retrógradas e reacionárias se apoderaram e hoje controlam, inclusive pela chantagem e dinheiro, até mesmo partidos e/ou segmentos partidários que surgiram com o propósito de combatê-las. Assim, não há reforma política democrática, não há reformas sociais de base, como nos setores agrários e midiáticos; não há acolhimento das emergências sociais, como a redistribuição justa da riqueza e igualdade oportunidade na educação ou no mercado de trabalho; não existe renovação nos quadros da política…
Essas questões denunciam que os partidos políticos, em especial os que se forjaram no pensamento revolucionário, se perderam ou se entaniçaram no cipoal das convivências e conveniências armado pelo poder e pelos poderosos. Não há, diante desse quadro desesperador e preocupante, outra tendência senão a da repetição de velhas figuras, algumas muitíssimas desbotadas, nas eleições de outubro próximo. O Amazonas não foge a essa triste realidade: “filhotes” do coronelismo de barranco traçam suas estratégias e táticas para ver quem assumirá o controle dos cofres do estado e da elaboração das leis. Nos bastidores desse jogo, faltam teses e propostas que vislumbrem a democracia como ideia e prática do poder soberano do povo, mas sobra esperteza para tentar convencer os eleitores de que “todos nós” estaremos bem representados no executivo e no legislativo da “(res) publica”.
Nas manifestações gerais de rua em junho do ano passado e em outras mais pontuais e com menor repercussão, a população emitiu sinais de profunda insatisfação com os partidos políticos e seus modos de fazer política sem ou com participação popular restrita. Se não fizessem ouvidos moucos à voz das ruas, os políticos teriam realizado reformas importantes, entre as quais, a que venha a democratizar o pensar e o fazer políticos, seja por meio dos partidos e/ou por meio de outras formas de representação social. O que se percebe desse e de outros fatos é que as mudanças sociais dependem das estratégias e táticas da população – e não dos políticos – nas urnas e nas ruas.

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